Ela já havia passado por momentos difíceis. Na sociedade em que vivia, somente o fato de ser mulher, já a tornava uma marginalizada. Além disso, espíritos imundos habitavam o seu corpo.
Mas aquele dia era o pior de sua vida. Diante dela, com o corpo dilacerado, estava a única pessoa que a valorizava como pessoa, independentemente do que falavam a respeito dela. Ele não a via como os outros a viam. Seu olhar era de ternura e resgatava-lhe toda a dignidade perdida.
Ela percebia as dores que ele sentia. Dores na carne e dores na alma. Essas dores lhes eram familiar. Antes de ter se encontrado com ele, ela sentira essas dores várias vezes.
Ficou ali perto dele, lembrando de que quando o povo a julgava sem nenhuma misericórdia, muitas vezes não eram só as vozes que a faziam sentir dor, mas o peso do julgamento chegava-lhe ao corpo. Mas ela sabia, que mesmo que o corpo doesse, a alma sim, era a que sentia mais dor.
Ela se lembra então do momento do encontro com aquele homem. Ele era diferente de todos os outros homens. Enquanto ninguém dava nada por ela, fazendo-a desacreditar dela mesma, ele agiu de forma diferente e a libertou.
Acostumada à solidão, ela agora passou a acompanha-lo por onde ele fosse.
Olhou mais uma vez para ele, e se sentiu impotente. Pensava consigo mesmo: “ele que me trouxe a vida, agora caminha para a morte, e eu não posso fazer nada”.
Em um esforço gigantesco, ela se lembra de uma canção, que falava um pouco sobre o seu encontro com ele, de como era sua vida, e como sua vida mudou após este encontro.
Tentando não chorar, ela então se põe a cantar:
“Ainda bem
Que agora encontrei você
Eu realmente não sei
O que eu fiz pra merecer
Você
Porque ninguém
Dava nada por mim
Quem dava eu não tava a fim
Até desacreditei
De mim
O meu coração
Já estava acostumado
Com a solidão quem diria
Que ao meu lado você iria ficar
Você veio pra ficar
Você que me faz feliz
Você que me faz cantar
Assim
O meu coração já estava aposentado
Sem nenhuma ilusão
Tinha sido maltratado
Tudo se transformou
Agora você chegou
Você que me faz feliz
Você que me faz cantar
Assim”
Ele escuta a música, comovido pela mudança realizada na vida dela, tem total certeza de que sua missão havia sido cumprida, dá um grito com toda a força de sua voz e diz:
Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito
Ela então não contem o choro, derrama as lágrimas de uma saudade anunciada, mas ao mesmo tempo, se sente feliz, pois ele, ao resgatar a sua dignidade, resgatou a dignidade de todas as outras mulheres marginalizadas.
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3 comentários
Lindo demais. Parabéns pelo texto.
Muito lindo…!!
No primeiro dia da semana, bem cedo, estando ainda escuro, Maria Madalena chegou ao sepulcro e viu que a pedra da entrada tinha sido removida.