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Narrativas mitológicas na Bíblia Hebraica

PLANO DE AULA

Curso de extensão: Narrativas mitológicas na Bíblia Hebraica

Aula 01/10 – Introdução à Mitologia de Gênesis

Unidade Curricular: Teologia

Carga Horária: 4 horas

Docente responsável: Ronildo Brites

 

Objetivos Conteúdo Método Recursos didáticos Avaliação
1.       Gerais

a.       Definir e diferenciar mito de mentira.

2.       Específicos

a.       Diferenciar mito no senso comum e mito como elemento de formação histórico-cultural.

b.      Compreender os mitos na narrativa bíblica dos primeiros capítulos de Gênesis.

 

1.       O que é um mito?

a.       Mito e história.

b.      Mito e lugar social.

c.       Mito da criação

d.      Adão, Eva e Jardim do Édem como narrativa mitológica da perfeição.

1.       Discussão sobre conteúdo do filme Narradores de Javé.

2.       Aula expositiva

 

1.       Apresentação de filme “Narradores de Javé.

2.       Apresentação de texto e/ou Slide

Dinâmica da descrição da história de vida de um dos alunos, reproduzida por vários representantes da turma.

Roteiro da aula

Exibição do filme “Narradores de Javé”. – Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Trm-CyihYs8&t=729s

O que é um mito?

Com a mente primitiva, o Homem sente a necessidade de encontrar explicações em uma natureza totalmente desconhecida. Essas explicações recebem a denominação de Mitos. Trata-se de uma narrativa de caráter simbólico relacionada a uma determinada cultura, que procura dar razão aquilo que é desconhecido, explicando a origem de todas as coisas. Nesse sentido, mito não é o mesmo que mentira, como compreende o senso comum.

Mito e história

Antes mesmo de se pensar em codificar a linguagem falada, a história já era contada de geração em geração. Esta forma de contar a história está recheada de narrativas mitológicas, onde o ser humano, cujas mentes primitivas não conseguiam explicar cientificamente, dá razão aos seus questionamentos,.

Mito e lugar social

A construção mítica de qualquer povo, aponta também para seu lugar social. As sociedades, originalmente formadas por pequenos clãs, se estruturaram em sociedades patriarcais, estabelecendo uma construção social, com registros puramente mitológicos. Esta estrutura de formação social está permeada em todo o texto sagrado de Judeus e Cristãos, bem como em outras culturas fundamentadas em suas religiões.

Mito da criação

Quando a narrativa bíblica aponta para a criação do ser Humano, feito pelas mãos de uma divindade suprema, que põe ordem ao caos, ela não está simplesmente criando uma divisão entre criacionismo e evolucionismo. O que de fato está acontecendo na narrativa bíblica, é a única explicação que o ser humano tem para estabelecer as origens de sua existência. O mito da criação aponta não para a ciência, mas para a fé de um povo no Ser a quem creditam suas origens.

Adão, Eva e Jardim do Édem como narrativa mitológica da perfeição.

A redação intencional do texto  de Gênesis, sobretudo seus 3 primeiros capítulos, aponta para um retorno a um momento perfeito. É a percepção de quem não vive mais as condições perfeitas de um lugar original, pensando que, se não tivessem chegado onde chegaram, estariam vivendo em seu lugar social original: o Paraíso.

O ser humano conta de geração em geração os feitos de seus antepassados, até que chega a um momento histórico onde sente a necessidade de registrar esses feitos.

Desta forma, a redação das narrativas bíblicas da criação do mundo, dos primeiros habitantes é um trabalho intencional, com a perspectiva de enaltecer os feitos de um determinado povo.

Narrativas bíblicas e Narradores de Javé.

A história do filme “Os narradores de Javé” se desenvolve sob a premissa dos mitos fundadores e da formação de identidades culturais. Há conflitos de versões, que derruba a possibilidade de uma verdade absoluta, mostrando como os povos criam suas imagens e mitos sem o compromisso rigoroso com a ciência e a objetividade.

“Uma coisa é o fato acontecido, outra coisa é o fato escrito. O acontecido tem que ser melhorado no escrito de forma melhor, para que o povo creia no acontecido” Antonio Biá – Narradores de Javé.

Eclasiastes de Salomão e banda Marmelade

Elementos da revelação e do relacionamento de Deus na cultura humana .[1]

Introdução

O cristianismo, ao longo de sua história, teve que conviver com as realidades múltiplas da cultura de cada lugar por onde ele se aportou. De modo tenso, em grande parte da história, o cristianismo se impôs como a única forma de se chegar ao Sagrado. Nesse sentido, o cristianismo ditou normas, as quais não sendo seguidas, gerava aqueles que não as seguiam algum tipo de desconforto, exclusão e em muitos casos, tortura e morte.

É preciso então, compreender como a cultura de um povo pode ser um fator de aglutinação e não de dispersão da mensagem do evangelho ensinado por Jesus de Nazaré. A aproximação do ser humano do Sagrado exige-lhe que sepulte seu contexto cultural? A cultura é em si mesma profana?

Tentaremos ao longo desse artigo, discutir sobre essas questões sobre a relação da cultura com o Sagrado e o ambiente de fé religiosa, notadamente o cristianismo. Não é nossa pretensão, enxergar nessas poucas linhas a solução para tão grande discussão, mas um início de uma reflexão que enxergue a fé e a cultura como não sendo, necessariamente, auto-excludentes.

  1. Sobre o conhecimento humano de Deus[2]

O conhecimento de Deus pelo ser humano é, antes de tudo, uma ação que está permeada de tentativa e fracasso. Conhecer com a mente finita aquele que é infinito é por si só, uma tarefa que não logrará êxito.

Então, o que se quer dizer quando alguém diz que conhece a Deus, ou quando alguém faz um convite para o conhecimento de Deus? Do ponto de vista cristão, conhecer Deus através dele mesmo não é o melhor caminho. José Maria Castilho, em sua obra “Deus e a nossa felicidade” declara que “para conhecer a Deus, não se pode começar por Deus em si mesmo”[3]. Nesse sentido, dizer que se conhece a Deus por sua própria experiência é, na realidade, dizer que conhece uma imagem que se faz de Deus.

A revelação de Deus para a humanidade, essa sim, faz todo o sentido. Nela, não há chances de equívocos, pois quem se auto-revela também se auto-conhece, não havendo, portanto, oportunidade para uma revelação de segunda classe. Então, para que o Homem conhecesse Deus, Ele mesmo teve que se revelar.

Essa revelação é feita no contexto cultural de um povo. Primordialmente, o povo de Israel. Tentar compreender Deus e suas manifestações no meio deste povo, desvinculando-o do ambiente cultural de Israel, é no mínimo gastar tempo com divagações que não levarão a lugar algum.

Tomando como exemplo as festas em Israel, poderemos perceber a estreita relação entre a cultura do povo e seu relacionamento com Iahweh, o Deus de Israel. Existem três festas mais significativas em Israel: a Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos. Estas festas serviam para mostrar a união do povo e o livramento que Iahweh lhes dera. Na obra “A Palestina nos tempos de Jesus, de Saulnier e Rolland, temos uma declaração sobre as festas.

Três festas exercem, em Israel, um papel importante; são momentos em que o povo faz questão de se reunir para manifestar a solidariedade que une seus membros e para celebrar as grandes intervenções do Senhor, libertador de seu povo: são as três festas de peregrinação, Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos (ou Tendas). “Três vezes por ano, declara o Deuteronômio, todos os vossos varões se apresentarão diante do Senhor vosso Deus no lugar que ele tiver escolhido: na festa dos Ázimos, na festa das Semanas e na festa das Tendas” (Dt 16,16). Essas festas parecem ser, no início, celebrações ligadas ao ritmo da natureza: na primavera, os nômades oferecem à divindade os primogênitos do seu rebanho (páscoa) e os camponeses sedentários, as primícias da colheita da cevada (festa dos ázimos); a festa das semanas situa-se no verão, no fim da colheita do trigo e a das Tendas, no outono, no fim da colheita das frutas. No decurso dos séculos, essas festas foram “historicizadas”, quer dizer, é ligado a cada uma delas um acontecimento histórico.[4]

É importante perceber, que as festas principais foram, como dizem os autores, “historicizadas”. Nesse sentido, compreendê-las com somente uma festa religiosa, retira delas esta característica relacional com a história do povo de Israel. Por outro lado, mesmo sendo festas de caráter religioso, não há como separá-las da história e da cultura desse mesmo povo.  Este é um pequeno exemplo de como não é possível desvincular o conceito teológico sobre o Sagrado, das relações cotidianas de um povo.

Sendo então a revelação de Deus, algo que tenha início no próprio Deus, podemos considerar como sendo esta revelação a mais adequada possível. Dizendo de outra forma, um ser que se conhece por completo, tem o poder de se revelar completamente, pois não tem limites em si mesmo, nem para quem ele se revela. Entretanto, é em para quem ele se revela que residem as limitações. Nesse sentido, Deus ao se revelar em sua plenitude, não o faz a partir de si mesmo, mas a partir de categorias conhecidas pelo ser humano.

Este conhecimento então, não está para além do que é natural, pois se não fosse assim, o homem natural, com sua mente limitada não o compreenderia. É no dia a dia, nas relações com a natureza, nas manifestações de sua própria criação que Deus se revela ao homem. O Salmista enfatiza muito bem isso.

Os céus contam a glória de Deus, e o firmamento proclama a obra de suas mãos. Um dia entrega a mensagem a outro dia, e a noite a faz conhecer a outra noite. Não há termos, não há palavras, nenhuma voz que dele se ouça; e por toda a terra sua linha aparece, e até aos confins do mundo a sua linguagem. Ali pôs uma tenda para o sol, e ele sai, qual esposo da alcova, como alegre herói, percorrendo o caminho. Ele sai de um extremo dos céus e até o outro extremo vai seu percurso; e nada escapa ao seu calor. [5]

Para um homem primitivo, sem nenhum conceito teológico-sistemático sobre Deus, as respostas sobre a divindade eram dadas a partir daquilo que ele já conhecia. Ele já conhecia os céus e o firmamento. Bastava-lhe despertar para perceber essas manifestações da natureza. Este conhecimento é difundido dia após dia em discursos da natureza – um dia entrega a mensagem a outro dia.

Esse conhecimento não é limitado ao lugar de existência do Salmista, mas é difundido por toda a terra, indo até “os confins do mundo”. Nesta revelação, percebida pelo escritor do salmo, ele transforma os grandes astros em personalidades – Noivo em sua carreira – onde nada escapa de sua manifestação.

Essa percepção de Deus não é uma iniciativa humana. Castilho enfatiza isso, quando declara que “se tentarmos começar (explicar) por Deus mesmo, com o intuído de entendê-lo e explicá-lo, estamos sempre fadados ao fracasso”.[6]

Sendo essa revelação oriunda da própria divindade, esperar que ela seja limitada, é acreditar numa divindade limitada. Considerando a experiência com a divindade judaico-cristã, percebê-lo limitado é um paradoxo. Sendo essa revelação plenificada na encarnação de Deus, compreendemos que é impossível que ela seja minimizada pela cultura de um povo.

Na tentativa de separarmos a plena revelação de Deus da cultura de um povo, corremos o risco de uma tríplice diminuição. Diminuiremos Deus, que não é suficiente para se revelar na cultura de um povo. Diminuiremos a encarnação de Deus – Jesus, que mesmo sendo homem estaria separado das realidades do seu povo. Por fim, diminuiremos a própria cultura do povo, que tem intima relação com sua divindade, seja nos tempos da revelação parcial ou nos tempos da revelação plena.

  1. Sobre a salvação e a cultura  

Por muito tempo se pensou que fé e cultura eram auto-excludentes. Esse pensamento gerou um conceito errado sobre o que é santo e profano. Dessa forma, passou-se a creditar a cultura uma conotação profana e as relações com o Sagrado uma conotação Santa.

Tendo sido a revelação do Deus de Israel estabelecida no ambiente de Israel, essa revelação não esteve nunca isenta da cultura desse povo. Essa revelação, levada à outros povos, estabelece-se da mesma forma.

Aos primeiros cristãos, foi dito que eles testemunhassem do Cristo em Jerusalém, em toda a Judéia, Samaria e aos confins da terra. Nesse testemunho precisaram tanto enfrentar a morte, quanto ensinar o que o Cristo lhes ensinara. Esse ensinamento, em suas próprias terras, teve como pano de fundo a cultura do povo de Israel. Até esse momento não havia nenhuma mudança.

Com o surgimento das perseguições aos cristãos, eles tiveram que avançar em territórios não conhecidos, com culturas diferentes das suas originais. Desta forma, a propagação da mensagem do evangelho e a difusão da fé cristã tiveram que se encontrar com outras manifestações culturais e sociais. De fato, não haveria a possibilidade da fé e da salvação ser plenamente difundidas se fosse de outra forma. Miranda descreve sobre a relação da salvação com a cultura:

A autocomunicação de Deus, embora tematizada em outra cultura, deverá receber nova compreensão e nova expressão, se quiser ser para os membros dessa cultura o que ela de fato é: um evento salvífico. Isto significa que será acolhida, experimentada, expressa, vivida e proclamada com elementos próprio dessa cultura. Só assumindo os sentidos padrões, valores, orientações, sensibilidades, conscientemente, verbalizados ou inconscientemente embutidos nas práticas sociais de um grupo humano, a iniciativa salvífica divina poderá ser captada como Boa-Nova, como salvação, como plenitude para os membros desse grupo.[7]

É preciso então refletir sobre a participação da fé cristã na cultura de um povo. Ao se envolver com uma cultura diferente da original, dos tempos apostólicos, a fé cristã não precisou se negar em sua essência. Ao contrário disso, ela foi acrescentando à cultura e sendo acrescentada pela cultura. Miranda afirma que há uma troca entre a cultura cristã evangelizadora e a cultura que recebe as boas novas. A primeira recebe novas perspectivas, conhecimento e práticas de outras culturas, enquanto a segunda pode se apropriar de tudo que a ação de Deus estabeleceu em Jesus Cristo.[8]

Nesse sentido, ao se misturar com a cultura, a fé cristã não está perdendo essência, mas se fazendo mais concreta para a realidade do povo onde ela é difundida. Desta forma, separar a fé da cultura é transformar a fé em algo de menor intensidade e valor. Todavia, é o que se faz hoje no cristianismo. Criou-se uma dualidade onde fé e cultura são auto-excludentes.

Desta forma o humano e suas realidades são tratadas no campo cultural, e a religiosidade, no campo espiritual, como se pudesse fazer uma divisão deste ser tão completo e complexo – o ser Humano.

A experiência de fé está sempre vinculada a uma experiência do Sagrado. Dessa forma, incorreríamos em um erro grave, se tentássemos conceber uma divindade sujeita as mesmas limitações que aqueles seres humanos que com ela se relaciona.  Nesse sentido, a revelação de Deus, na experiência humana não pode ser limitada de modo que não contemple também um entrelaçamento com a cultura do ser que se relaciona com este mesmo Deus que se revela.

O criador criou seres com a capacidade de criar. Nesta co-criação, este ser não somente cria outro ser, mas cria significações para seu cotidiano. Desta forma, sendo a cultura este elemento que perpassa por essa criatividade do ser criado, não há porque desvinculá-la da revelação do ser criador.

A plena revelação de Deus se fez realidade em meio a cultura de seu povo. Entretanto, não é correto afirmar que em todos os elementos culturais há a manifestação do sagrado. Nas culturas ocidentais modernas, temos uma forte tendência individualista, onde o ser prefere ser para si mesmo e não para o outro. Por este prisma cultural, compreende-se que não é possível observar uma plena manifestação de Deus, que sempre quis se relacionar com o ser humano, não sendo, tal como na cultura ocidental, individualista. Sobre esse aspecto destaca Miranda:

[…]a cultura, como vimos, envolve padrões interpretativos da realidade de cunho noético ou afetivo, em geral, inconscientes, mas que fazem as pessoas abordarem por seus prismas a própria realidade. Poderíamos trazer como exemplo, o individualismo cultural reinante na atual sociedade ocidental. Sem dúvida alguma, situa-se em aberta oposição ao espírito evangélico do amor fraterno.[9]

Como podemos ver, há elementos da cultura que não estão necessariamente relacionados com a mensagem revelada. Caberá então uma reflexão, de modo que seja possível à fé se apropriar dos elementos culturais que possibilitem uma melhor propagação das revelações do Sagrado.

  1. Sobre a cultura pop e o texto sagrado de Eclesiastes de Salomão.

A partir deste ponto, tentaremos demonstrar como o ser humano em sua criatividade é capaz de elaborar conceitos de vida, possíveis de serem relacionados com o conceito teológico sobre a fragilidade da vida. Para esta demonstração, abordaremos o texto da música Reflections Of My Life (Reflexões sobre a minha vida) da banda escocesa Marmelade, e faremos um paralelo com o texto de Eclesiastes.

O texto de Eclesiastes parece destoar de um dos grandes livros da religião judaica. Se nos Salmos, há convites de júbilos, regozijos, brados de vitória, em Eclesiastes o convite é feito no sentido de se perceber que tudo na vida é fugaz e tudo é vaidade. Para o autor do livro, no fim de tudo, de todas as suas experimentações, o resultado é a descrição da vida cotidiana em um tom melancólico.

É possível encontrar na música Reflections Of My Life, essas mesmas características. O autor percebe que do nascer do sol até a chegada do luar, seus dias são preenchidos com o seu refletir sobre a vida e sobre os problemas de outras pessoas. Na letra da música, o autor declara:

A mudança do sol para o luar
reflexões sobre a minha vida,
oh, como elas enchem meus olhos
As saudações de pessoas com problemas
reflexões sobre a minha vida,
oh, como elas enchem minha mente.[10]

Salomão, por sua vez, não vê proveito na vida de trabalho do ser humano. A ansiedade causada por este estilo de vida, de fato consome a vida do homem. Ele trabalha durante o dia em dores e a noite sua mente não descansa.

Com efeito o que resta ao homem
de todo trabalho e esforço
com que seu coração se fadigou debaixo do sol?
Sim, seus dias são todos dolorosos,
E sua vida é penosa;
Mesmo de noite ele não pode repousar.
Isso também é vaidade[11]

O dois textos poderiam se fundir, numa proposta que aproxima o conhecido texto sagrado, com uma criação cultural de um lugar-espaço muito distante do texto original

A mudança do sol para o luar
são reflexões sobre a minha vida,
oh, como elas enchem meus olhos.
Com efeito o que resta ao homem
de todo trabalho e esforço
com que seu coração se fadigou debaixo do sol?
As saudações de pessoas com problemas
são reflexões sobre a minha vida,
oh, como elas enchem minha mente.
Sim, seus dias são todos dolorosos,
e sua vida é penosa;
mesmo de noite ele não pode repousar.
Isso também é vaidade.

O autor de “Reflections of my life” segue sua descrição melancólica sobre a vida. Em outra cena, carregada de tensão, ele vislumbra a possibilidade de retorno a um lugar de origem. Ele retorna ao lugar que lhe fez existir como ser humano e o faz depois de experimentar suas dores, tristezas e choros, a ponto de levá-lo a morte.

Todas as minhas tristezas, tristes amanhãs
levam-me de volta para minha casa
todos os meus choros,
sinto que estou sempre morrendo,
levam-me de volta para minha casa.[12]

O autor de Eclesiastes percorre um caminho semelhante. Para ele o fim de todo ser humano é a morte. Na morte, o escritor do texto sagrado reflete sobre a vida do ser humano e do seu retorno, através da morte, para as origens.

Tudo caminha para um mesmo lugar:
tudo vem do pó, e tudo volta ao pó.
Quem sabe se o alento do homem sobe para o alto
e se o alento do animal desce para baixo, para a terra?[13]

Da mesma forma, é possível reconstruir o texto, dando-lhe sentido a respeito do questionamento sobre a vida e a morte.

Todas as minhas tristezas, tristes amanhãs
levam-me de volta para minha casa.
Tudo caminha para um mesmo lugar:
tudo vem do pó, e tudo volta ao pó.
Todos os meus choros,
sinto que estou sempre morrendo
levam-me de volta para minha casa.
Quem sabe se o alento do homem sobe para o alto
e se o alento do animal desce para baixo, para a terra?

No terceiro bloco da música, o autor de “Reflections of my lyfe” percebe que precisa mudar. Usa a expressão “Arranging” que no sentido da música pode ser harmonizar, mas no sentido da vida pode significar conciliar ou organizar. Ele percebe que a vida, da forma como ele vive, o conduzirá à morte em vida. Ele precisa de se conciliar, de se organizar para poder viver no mundo que julga ser um mundo mal, mas que mesmo assim, vale a pena viver nele, pois, de fato, ele não quer a morte.

Eu estou mudando, arranjando, Eu estou mudando
eu estou mudando, ah, tudo a minha volta.
O mundo é um lugar mau, um lugar mau
um terrível lugar para se viver,
oh, mas eu não quero morrer.[14]

O escritor do texto sagrado também compreende essa necessidade de mudar para viver. Percebe que na vida, vivida em opressão não há de fato vida. Melhor seria então a morte. Melhor ainda o não ter nascido. É uma declaração da dor de uma vida sob o peso dos opressores.

Observo ainda as opressões todas
que se cometem debaixo do sol:
Aí estão as lágrimas do oprimido,
e não há quem os console.
Então eu felicito os mortos que já morreram,
mais que os vivos que ainda vivem.
E mais feliz que ambos é aquele que ainda não nasceu,
que não vê a maldade que se comete debaixo do sol.[15]

Finalizando a redação do texto, poderíamos compreender a fala dos dois homens inspirados por Deus:

Eu estou mudando, arranjando, eu estou mudando,
eu estou mudando, ah, tudo a minha volta.
Observo ainda as opressões todas
que se cometem debaixo do sol:
aí estão as lágrimas do oprimido,
e não há quem os console.
O mundo é um lugar mau, um lugar mau
um terrível lugar para se viver.
Então eu felicito os mortos que já morreram,
mais que os vivos que ainda vivem.
E mais feliz que ambos é aquele que ainda não nasceu,
que não vê a maldade que se comete debaixo do sol.
oh, mas eu não quero morrer.

  1. A conexão do ser humano com a cultura e com o Sagrado.

No exemplo da musica “Reflections of my life” foi possível evidenciar a possibilidade de uma manifestação cultural alinhar-se com os conceitos teológicos do texto sagrado. Negar a essa criatividade do autor da música, essa conotação divina, é retirar dele a porção divina que lhe foi entregue: o fôlego divino.

Velasco afirma em seu texto “A Experiência Cristã de Deus” que as manifestações culturais, tais como poesia, literatura e arte, nas sociedades mais secularizadas, apontam para uma experiência que abre o horizonte da vida humana, inserindo-a num nível de realidade diferente da cotidiana.[16]

Tendo Deus se revelado na cultura de um povo, negar a essa cultura um lugar de destaque é, em última análise, negar a possibilidade de Deus interagir com o ser que ele criou, o que é, em certo sentido, um paradoxo.

O homem não consegue se relacionar só com a cultura, ou só com a fé. Dizendo de outra forma, o ser que tem uma experiência com o sagrado, não conseguirá escolher entre a sua fé e a sua cultura. Vivenciando a fé e tudo que a envolve, ele o fará a partir da cultura onde está inserido.

O Homem não acorda um dia e decide ou viver a fé, ou viver a cultura, como se as duas fossem elementos que estivessem aguardando sua decisão. Miranda enfatiza essa dimensão da realidade humana:

Como tanto a cultura quanto a fé não são realidades estáticas, fixadas de uma vez por todas, mas sofrem continuamente mutações de origem endógena ou exógena, a inculturação da fé constitui um processo continuo, do qual nunca se pode dizer que chegou ao fim. De fato a fé é primordialmente vida: atitudes, modos de pensar, de viver, de celebrar, de se relacionar dos próprios cristãos. O mesmo podemos afirmar das culturas: um modo de existir inserido numa cosmovisão, que o fundamenta, dá sentido, e é vivido por determinado grupo humano. [17]

O que se pode perceber, entretanto, é uma dualidade onde se tenta separar fé da cultura. A religiosidade humana não consegue enxergar a nocividade desta tentativa. Desta forma, produzem um relacionamento Criador-criatura destituído de seu verdadeiro valor e amputado de uma revelação do Sagrado que de fato valha a pena. Essa dualidade concebida pelo homem é vista por Miranda como algo que “dificulta sobremaneira avaliar corretamente sua mútua interação, trazendo sérios prejuízos, seja à fé, seja à cultura.”[18]

Esta percepção de Fé como algo positivo que direciona o ser humano para o Sagrado e da cultura como algo negativo e que o afasta do sagrado é manifesto nos ambientes de fé, sobretudo da fé cristã, como uma divisão entre as coisas do mundo e as coisas que não são do mundo.

Este pensamento dualista de sacro e profano, gerado provavelmente a partir de traduções da palavra κόσμος – Kosmos no texto de 1João 5.19.[19] – οἴδαμεν ὅτι ἐκ τοῦ Θεοῦ ἐσμεν, καὶ ὁ κόσμος ὅλος, ἐν τῷ πονηρῷ κεῖται. (Nós sabemos que somos de Deus e que o mundo inteiro está sob o poder do maligno), associou a palavra κόσμος – mundo, e o fato dele estar sob o poder do maligno, fazendo com que grande parte dos cristãos compreenda que a expressão mundo é tudo aquilo que se opõe a relação com o Sagrado.

Todavia, ao relacionar sua fé a cultura, o homem não se desconecta de Deus para se conectar ao “mundo”. De fato, esse mesmo Deus a quem o Homem se conecta por fé, está presente no κόσμος – mundo, e tanto se revela a ele, mundo, no sentido das pessoas e suas realidades, quanto se revela nele, mundo, no sentido de lugar.

  1. Considerações finais.

Como foi possível verificar ao longo do texto, sendo Deus aquele que decide se revelar ao Homem, ele o faz por meio de suas múltiplas possibilidades. Desta forma, não se restringe em função de estar em uma cultura diferente da original do texto sagrado.

O ser humano é co-criador com Deus, desta forma está habilitado para a produção de elementos culturais que dêem significado à fé, independentemente do tempo e lugar. Nessa co-criação ele não só solidifica sua fé, como também transforma sua cultura.

Uma das formas que o homem encontrou para significar sua existência é a fé. Mesmo que a outra seja a cultura, isso não significa dizer que cultura e fé não possam caminhar juntas. Ele se resignifica tanto na fé quanto na cultura.

 O sagrado não se aprisiona nem se deixa aprisionar. Suas manifestações são plurais e abrangentes. A tentativa de separar fé da cultura, gera um Deus que não pode viver no mundo que ele próprio criou. Tendo em vista que Ele precisou se esvaziar para dar espaço à criação, não é possível compreender que abra espaço para a criatura, mas fecha-se para os elementos culturais da criatura criada.

É preciso então refletir nas categorias de manifestação da fé, e percebê-la. Se estiverem desassociadas da cultura, será preciso envidar esforços no sentido de mostrar a possibilidade real das duas andarem juntas e se completarem.

Referências

Livros 

SAULNIER, Cristine. ROLLAND, Bernard, A Palestina nos tempos de Jesus. PAULUS. São Paulo, Brasil, 1983.

CASTILHO, José Maria, Deus e a nossa felicidade. EDIÇÕES LOYOLA, São Paulo, Brasil, 2006.

VELASCO, Juan Martins. A experiência cristã de Deus. PAULINAS, São Paulo, Brasil, 2001.

MIRANDA, Mario de França. Inculturação da fé: uma abordagem teológica, EDIÇÕES LOYOLA, São Paulo, Brasil, 2001.

Sites                                                                                           

Letra da música “Reflections of my lyfe” da Banda Marmelade. Disponível em: <http://www.songlyrics.com/the-marmalade/reflections-of-my-life-lyrics> acesso em 26 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador.

Novo Testamento Interlinear. Disponível em:< http://bibliaportugues.com/interlinear/1_john/5-19.htm> Acesso em 28 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador, a partir da tradução do grego para o Inglês.  

 Bíblia

Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.

[1] BRITES, Ronildo. Pós Graduando em Ciências da Religião com ênfase em Ensino Religioso – Universidade Unigranrio.

[2] O termo Deus ao longo do texto fará referência ao sagrado conhecido no meio judaico-cristão.

[3] CASTILHO, José Maria, Deus e a nossa felicidade, p. 23

[4] SAULNIER, Cristine. ROLLAND, Bernard. – A Palestina nos tempos de Jesus. p. 35

[5] Salmos 19. 1-7. Bíblia de Jerusalém.

[6] CASTILHO, op. cit, p. 24

[7] MIRANDA, Mario de França. Inculturação da fé: uma abordagem teológica, p 56

[8] Idem

[9] MIRANDA, Mario de França. Op. Cit, p 57

[10] Letra da música “Reflections of my lyfe” da Banda Marmelade. Disponível em: <http://www.songlyrics.com/the-marmalade/reflections-of-my-life-lyrics> acesso em 26 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador.

[11] Eclesiástes de Salomão 2.22-23, Bíblia de Jerusalém.

[12] Letra da música “Reflections of my lyfe” da Banda Marmelade. Disponível em: <http://www.songlyrics.com/the-marmalade/reflections-of-my-life-lyrics> acesso em 26 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador.

[13] Eclesiástes de Salomão 3.20-21, Bíblia de Jerusalém.

[14] Letra da música “Reflections of my lyfe” da Banda Marmelade. Disponível em: <http://www.songlyrics.com/the-marmalade/reflections-of-my-life-lyrics> acesso em 26 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador.

[15] Eclesiástes de Salomão 4.1-3, Bíblia de Jerusalém.

[16] VELASCO, Juan Martins. A experiência cristã de Deus. p.23

[17] MIRANDA, Mario de França. Op. Cit, p 57

[18] Idem, p. 59

[19] Novo Testamento Interlinear. Disponível em:< http://bibliaportugues.com/interlinear/1_john/5-19.htm> Acesso em 28 de fevereiro de 2016. Tradução do pesquisador, a partir da tradução do grego para o Inglês.  

O Sagrado sob a óptica do humano: as percepções do Deus ilimitado a partir de seres humanos limitados.

INTRODUÇÃO.

Buscaremos nesse artigo compreender a relação do ser humano com o Sagrado e os possíveis desdobramentos desta relação, sobretudo nos conceitos atribuídos ao Sagrado por parte daqueles que devotam sua fé num ser para além das compreensões naturais.

Abordar este tema torna-se necessário para que se faça uma reflexão sobre as reações humanas sobre Sagrado e Religião, suas implicações na sociedade humana e suas consequências, quando essas relações se tornam belicosas.

O SAGRADO SOB A ÓPTICA DO HUMANO: AS PERCEPÇÕES DO DEUS ILIMITADO A PARTIR DE SERES HUMANOS LIMITADOS.

Nos últimos anos, de forma mais acirrada, a expressão intolerância religiosa tem estado bem em voga. As religiões, que em seus arcabouços trazem diretrizes pacíficas, tem sido deturpada por pessoas que não conseguem lidar com a diversidade humana.

A capacidade humana de refletir sobre sua própria história e fazer sua própria escolha, foi um dos motivos que levaram o ser humano a evoluir, construindo seus conceitos de vida e de convivência tanto entre seus pares quanto com suas divindades.

Numa escala assustadora, podemos perceber uma verdadeira guerra religiosa, onde cada religioso quer fazer com que todo o restante do mundo compreenda que sua religião, e de mais ninguém é a certa. Desta forma, os religiosos fazem uma manipulação do Sagrado, e o constrói a partir das suas próprias realidades.

Mas o que é de fato, o Sagrado? Qual religião pode ser considerada como detentora do Sagrado? Pode o Sagrado ser manipulado em uma guerra santa, onde o que se quer é impor a crença que se acha mais adequada?

Podemos pensar sobre o Sagrado, como sendo algo visto a partir das concepções humanas. Não é o Sagrado que diz de si mesmo o que ele é, mas são as percepções humanas que dizem do Sagrado, afirmando suas condições e suas qualidades. Nesse sentido, as percepções do Sagrado são, antes de tudo, humanas e racionais.

Sendo essas percepções humanas e racionais, elas tenderão a carregar consigo as características do humano, com toda sua complexidade, incluindo nessa complexidade quer seja sua bondade e maldade. O Sagrado ganhará desta forma, as matizes humanas e será oferecido aos seres humanos a partir dessas matizes e não de fato como ele é.

Rudoff Oto afirma que:

Toda a concepção teísta, e de uma maneira excepcional a ideia cristã de Deus, tem como caráter essencial compreender a divindade como uma clara precisão e defini-la com a ajuda de predicados como: espírito, razão, vontade teleológica, boa vontade, omnipotência, unidade de essência, consciência de si e outros termos parecidos. Esta concepção da divindade corresponde, pois, à razão pessoa que o homem encontra em si mesmo sobre uma forma limitada e reduzida.[1]

Podemos perceber então, que uma é a manifestação do Sagrado, independentemente dos conceitos estabelecidos pelo ser Humano e outra e a percepção que este ser humano tem do Sagrado. Nesse sentido, o Sagrado é aquilo que o homem diz e quer que ele seja.

Esta percepção humana do Sagrado, difundida ao longo dos anos, em várias culturas e tradições religiosas, fazem do Sagrado, não um objeto de adoração, mas um objeto de manipulação.

Já é notório, através dos compêndios históricos, o quanto essas percepções do Sagrado foram danosas à própria existência e convivência humana. Guerras foram feitas em nome de um Deus, que não sublocou a nenhum ser humano esta necessidade beligerante.

A percepção própria de um povo sobre seu Deus foi, em muitos casos, a motivação para que se estabelecesse um caminho de guerra para a imposição deste pensamento religioso, mesmo que este ser supremo a quem todas as religiões chamam de Deus, não faça de fato essa distinção.

A percepção humana às manifestações do sagrado, suas características e predicados, são tidas pelo ser humano como sendo absolutos. Como absolutos, não podem ser contrariados. Desta forma, as atrocidades perpetradas pelos religiosos sejam de quais forem suas tradições religiosas, são consideradas como atos ratificados pelo Sagrado, ou de fato, pelas suas concepções do Sagrado. ­

Os atos cometidos por religiosos a partes de uma população que não comunga de sua fé, é estabelecido em decorrência de uma percepção errônea de que aquilo que se pensa do Sagrado, é de fato o Sagrado. Além disso, acreditam alguns que, por admitirem predicados racionais à divindade, a mesma pode ter sua essência esgotada.

Desta forma, a divindade, o Deus que se espera ser tudo sobre todos, acaba por ocupar uma posição menor do que aquele humano a quem ele deveria estar sobre. Tendo uma essência que se pode esgotar, esse ser não pode ser considerado Deus.

As conceituações do Sagrado, nas mais diversas tradições religiosas, partem de seres humanos limitados. Essas definições, entretanto, não afirmam que o Sagrado talvez seja, mas que o Sagrado é. Na visão cristã, o conceito de Deus é “Deus é Espírito Pessoal, perfeitamente bom, que, em santo amor, cria, sustenta e dirige tudo.”[2]

Como podemos notar, a conceituação cristã do Sagrado não permite qualquer tipo de subjetividade. Ao afirmar que Deus é, as possíveis divergências sobre o ser de Deus não são levadas em conta.

Diante dessa afirmação, qualquer pensamento diferente gerará um antagonismo, levando aqueles que discordam da afirmação a estarem contra aos que concordam.

Essa relação de antagonismo de fato se dá não pelo que o Sagrado é, mas por aquilo que os fiéis definem que ele é. Evidentemente, nas escrituras tanto de Judeus, quanto de Cristãos e islâmicos, há indícios dessa conceituação, entretanto, a conceituação em si é fruto de observações humanas. Além disso, há pontos na conceituação que destoam da forma de crer de outras tradições religiosas.

Se a conceituação do Sagrado fosse isenta da participação humana, seria de se esperar que fosse comum à todas as tradições religiosas. Ao observarmos a pluralidade de conceitos acerca do Sagrado, perceberemos que não há homogeneidade, pois é oriundo de uma mente finita.

Pela percepção humana do Sagrado, encontramos seres humanos que compreendem que devem estender a mão e ajudar ao necessitado, mas temos também outros seres humanos que compreendem que se vestir de explosivos e matar os infiéis é algo que o Sagrado exige e premia.

A compreensão humana do Sagrado distancia aqueles que compreendem uma realidade inerente ao sagrado: o mistério. Para Oto, as religiões que tentam explicar suas idéias acabam por “diminuir e enfraquecer a própria experiência.” Oto, ainda afirma que: “Destas ideias é que procede, não a religião, mas a racionalização da religião, tem como resultado uma teoria tão copiosa e interpretações tão plausíveis que o misterioso fica eliminado.”[3]

A revelação do Sagrado sempre teve um caminho que parte do Sagrado ao humano. Entretanto, a existência do primeiro, precede ao segundo, logo, não é possível conceber uma revelação do Sagrado a partir do humano que seja de fato eficaz.

Ao tentar sintetizar aquilo que é mistério, o humano cria um mito. A criação do mito parte de uma mente finita e que ainda não internalizou grandes conteúdos vivenciais. Por conta disso,o humano precisa nivelar o fato religioso. Esse nivelamento, segundo Otto, fará com que o fato religioso seja rebaixado a ponto de perder seu real significado.[4]

Perdendo o fato religioso seu real significado, o humano há de dar novo sentido ao que se perdeu sentido. Pensando por esse prisma, se torna possível refletir no que de fato tem sido a religião moderna e todas as suas implicações na sociedade.

O homem atual não sobrevive sem buscar sentido à sua existência. Nos tempos antigos, todos os fatos relacionados à existência humana podiam ser creditados, ora ao acaso, ora a manifestação soberana das divindades. Atualmente é preciso que se tenha sentido e motivação para uma existência.

No caminho dessa busca existencial, por vezes o homem confunde progresso com retrocesso. Na ânsia de alcançar o sentido para suas vidas, se entregam a práticas rudimentares e fundamentalistas, no que se refere as suas relações com o Sagrado. Abumansur vai dizer que:

É um movimento de retomada dos valores considerados perenes e, portanto verdadeiros, é uma busca de definição é rigor. Ressurgem os fundamentalismos de todas as colorações, as certezas e os integrismos. É a afirmação de identidades pessoais e grupais a despeito de tudo e de todos. É o individualismo que encontra, nos pequenos grupos, o espaço de afirmação de sua identidade, de reconhecimento e de sua diferença.[5]

A Europa convulsionada, sendo, do seu ponto de vista, invadida por pessoas das quais já não quer mais ter contato, revela uma dado assustador. Vindo de seus países, com culturas plurais, os refugiados querem lograr um só intento: sobreviver. Entretanto, ao que se demarca nas reações controversas dos países europeus, a visão destes é que aqueles estão querendo entrar para desestabilizar suas existências.

Em contrapartida a esse movimento migratório moderno, encontramos nos países de origem, grupos radicais que, em nome de uma fé, de um Deus e de uma religião, persegue, tortura e mata seus próprios similares.

A este tipo de ação, chamam-na revolução. Todavia, revolução no sentido mais estrito da palavra é transformação profunda, ao contrário do sentido mais aplicado a estes casos, tal como revolta. Esta revolução ou esta revolta tem caráter impositivo, de não permitir ao divergente a possibilidade de divergir. A partir desse tipo de revolução, tenta-se implementar ou, em ultima instância impor o tipo de fé que se acha a mais acertada, o deus mais poderoso e a religião que se embrenha com a atividade do Estado. Balandier, citado por Abumansur, vai dizer que:

As respostas revolucionárias crêem poder inventar sentido a partir da ruptura radical com a ordem estabelecida e da adesão incondicional a um projeto de remodelação profunda da sociedade na qual a política torna-se objeto de fé e, em decorrência, as relações entre as pessoas expressam-se em termos de fidelidade. […] Da esperança revolucionaria, ficou sua face mais repulsiva, a violência.[6]

A palavra terrorismo tem sido aplicada geralmente a grupos, sobretudo ligados a religião islâmica, entretanto, queremos dar a esta palavra todo peso que ela traz em si mesma, no sentido de denunciar os diversos tipos de terrorismos manifestados pelo humano em nome do Sagrado, ou, para sermos coerentes, com o que se diz do Sagrado.

Nesse sentido, ao ampliarmos a definição de terrorismo, como sendo uma dominação pelo terror, encontraremos em outras confissões religiosas, que não sejam somente as de tradição islâmica, este arcabouço de dominação, até mesmo nas religiões de cunho pacifista como, por exemplo, o cristianismo.

Uma rápida olhada para a história da igreja cristã, seja no momento pré-reforma ou no momento pós reforma, e encontraremos indícios de que não foram (e são) somente as religiões tidas como fomentadoras de movimentos radicais que promovem o terrorismo.

Sob esta perspectiva, precisamos lançar um olhar mais acurado sobre a forma como o ser humano lida com o Sagrado e como ele fundamenta sua crença, sobretudo em relação aquele que não acredita da mesma forma.

O que se pode perceber, de fato, é que a fé tem se tornado não objeto da devoção ao sagrado, mas um dos muitos mecanismos de repressão ao ser humano e às suas liberdades, de modo que, ao pensar diferente, seja condenado por aquele que o julga infiel, sendo o divergente alvo de todo tipo de ataque e sacrifício.

Podemos compreender, então que, o terrorismo, seja ele incitado por qualquer tipo de tradição religiosa, é somente ataque e sacrifício, enquanto que em outros tempos já foi usado como fonte de mudança.

É preciso então que se faça uma avaliação sobre o que de fato é compreendido como o Sagrado. É sabido que, nas grandes religiões estabelecidas, a pessoa de um ser supremo, pode agir de forma brutal, sem, contudo ser considerado um ser supremo maléfico. Nesse sentido, quaisquer manifestações de brutalidade e violência, seja em que âmbito for, revelarão um deus menor que aquele que é expresso pelas várias tradições religiosas.

Neste ponto, temos o surgimento de um Sagrado manipulado. Um sagrado que se deixa ser usado para justificar os atos dos humanos. Dessa forma, temos um sagrado abusado pelo humano.

Em conseqüência disso, o Sagrado ganha a forma que o religioso quer que ele tenha e não a forma que ele de fato tem. Sendo assim, podemos concluir que sob esta óptica inversa, o humano domina o Sagrado.

Desta forma, a religião perde seu sentido, pois devendo ser ela um organizador de um sistema de solidário de crenças[7], ocupa-se de impor uma crença que só se solidariza com seus pares.

Para os extremistas religiosos, das diversas religiões existentes, a percepção do Sagrado e do profano é simplesmente uma questão de ótica. Sendo assim, não deveria gerar os transtornos que geram, tendo em vista que a percepção humana nunca será homogênea. Durkeim compreende que as coisas sagradas são ambíguas e que dependendo da forma como são tratadas adquirem um caráter de santo ou profano.[8]

A convivência entre os religiosos, que deveria ser pacífica, sobretudo quando se pensa a partir do que seria a Mente do Sagrado, se torna insustentável. Todas as religiões, se apropriando de suas divindades, relegam as outras a um patamar herético e digno de toda danação infernal.

A pergunta que precisa de uma resposta é: pode ser chamado de Deus, alguém que incita seus seguidores a sacrificarem seus iguais? A resposta que nos parece ser mais adequada é que de fato não é Deus, mas a representação internalizada daquilo que o homem compreende como Deus. Há, nesse sentido, os que matam em nome de Deus, mas que na realidade, matam em nome do ser aterrorizante que definiram como sendo o seu deus.

Outro ponto importante a abordar, é que a concepção de Deus é norteada pela época em que essa concepção é estabelecida. Adolphe Gesché afirma que toda questão sobre Deus é datada e situada,[9] e que sendo assim, não enxergamos da mesma forma como outros povos enxergaram em outro tempo. Essa concepção recebe ainda com valores culturais de suas épocas.

A forma radical e intolerante como algumas tradições religiosas tratam as pessoas que não se alinham em fé com elas, demonstram uma percepção de verdade única. A verdade se torna então um objeto de manipulação.

Discutir a verdade sob o ponto de vista de uma perspectiva acerca do Sagrado é discutir uma das verdades possíveis sobre o Sagrado. Essa discussão sempre será infrutífera, quando a intolerância entre em voga, não deixando que as verdades, sob vários pontos de vistas e tradições religiosas sejam admitas.

O discurso religioso seja ele qual for, está fadado a ser um discurso vazio. Rubem Alves, em sua obra O que é Religião, enfatiza sobre o discurso religioso:

Enunciado de ausências, negação dos dados, criação da imaginação: só pode ser classificado como engodo consciente ou perturbação mental. Porque, se ele “não contém qualquer raciocínio abstraio relativo à quantidade e ao número”, “não contém raciocínios experimentais que digam respeito a matérias de fato e existência”, “não pode conter coisa alguma a não ser sofismas e ilusões”. Pior que enunciado de falsidades, discurso destituído de sentido.[10]

Partindo dessa assertiva sobre o discurso religioso torna-se mais fácil compreender que ele não se afirma a não ser sob a perspectiva de quem o discursa. Nesse sentido, o discurso que se faz das ações em nome Deus, como no caso de cristãos ou de Ala, como no caso do islamismo, é uma elucubração própria de quem os defende, não sendo, portanto, admissível como opção plausível para quem não defende a mesma ideia.

É importante salientar que a expressão intolerância religiosa, estando em voga nos dias atuais, quer seja a partir daqueles que se sente atingidos por ela, quer seja por aqueles que, em nome do Estado, legislaram contra ela, denota claramente que o caminho de convívio pacífico entre as diversas formas de manifestações religiosas e de lidar com o Sagrado, já não é algo pacífico.

Havendo uma expressão que exprime repulsa e uma lei que garante a punição para a prática, haverá também a percepção de que algo não estava caminhando com fluidez e liberdade e, por conta disso, se fez necessário uma intervenção, tanto como posicionamento da sociedade, quanto como lei estabelecida.

Consideremos os últimos acontecimentos na Europa, que, estando convulsionada por questões relacionadas aos refugiados oriundos de países cuja religião se misturou com a forma de administrar a nação. Aliado a toda a essa problemática, o mundo perplexo observa a fúria de radicais que matam em nome de seu Deus, ou da percepção que fazem dele.

Que tipo de separação será necessário que se faça diante de situações beligerantes como esta, considerando que os radicais acreditam que o que fazem são atos de uma relação com o Sagrado?

Na quadragésima segunda Surata, do texto sagrado da religião abraçada pelos terroristas que ceifaram vidas na França (e em outros lugares, inclusive entre seus pares), encontramos a declaração de que uma mesma divindade prescreveu uma só religião, fazendo menção inclusive ao Cristo dos cristãos.[11]

Sendo assim, parece-nos um contra censo que uma tradição religiosa queira matar parcelas da população que professem a fé no Sagrado, a partir de outras manifestações religiosas que não a deles.

Nesta disputa pelo poder do Sagrado, encontramos manifestações religiosas antagônicas, que entram em embate o tempo todo, revelando-se de fato não uma religião como se entende que ela seja, mas uma distorção do sentido do que é religião.

De fato, essa disputa pelo poder do Sagrado não está restrito às religiões consideradas pelos ocidentais como religiões de terroristas. Quando nos referimos aos jihadistas como fundamentalistas, não podemos nos esquecer que o cristianismo, em grande parte do mundo é também fundamentalista, mesmo que não seja jihadista, ao menos no sentido de se explodirem.

A inadequação da palavra por religiosos ocidentais, contra religiosos médio-orientais, acaba por criar um estigma de certo versus errado, onde se evidencia que o certo é o pensamento ocidental, civilizado e com estruturas religiosas mais flexíveis. Pensando desta forma, é perfeitamente natural que se marginalize aquele que não faz parte deste contexto religioso.

É preciso retroceder um pouco no tempo e perceber que o conceito de fundamentalismo não foi cunhado, em princípio para ser utilizado contra religiões médio-orientais. Em seu artigo “Coexistência cultural e “guerras de religião”, José Augusto Lindgren Alves, nos esclarece:

A palavra, nas línguas ocidentais, vem do entendimento puritano anglo-americano, divulgado nos Estados Unidos, de que os crentes devem se ater aos “fundamentos” da fé cristã: a Bíblia e suas “narrativas fundamentais”. Sua origem remonta ao século XIX e à reafirmação de dogmas contra o chamado liberalismo cristão e o Iluminismo em geral. O fundamentalismo evangélico atual, protestante ou católico, manifesta-se mais visivelmente na defesa do “criacionismo” bíblico, por oposição ao evolucionismo científico darwinista.[12]

Podemos perceber então, que o termo fundamentalista é, em certo sentido, ambíguo. Para os religiosos do ocidente, possui em seus ambientes de fé, um sentido positivo, entretanto, no ambiente de fé do médio-oriente, fundamentalista é, em última análise, aquele que mata pelos seus fundamentos.

Novamente temos aqui uma situação paradoxal, onde duas ou mais manifestações religiosas contradizem a própria essência do ser religioso, que o impulsiona para um relacionamento com o Sagrado, que em última instância é Sagrado para os quatro cantos da terra, não fazendo distinção da posição geo-político-religiosa em que se encontra o ser existente e o que este pensa do Sagrado.

Pode então o Sagrado ser apontado com responsável pelas calamidades espalhadas pela terra convulsionada? Cremos que a resposta é negativa, tendo em vista que se ele assim o fosse, as calamidades seriam sempre de um só grupo, que se autodenominaria como detentor das verdades do Sagrado, contra todos os outros que não seriam da mesma forma.

As guerras religiosas, as perseguições pelo poder religioso, as mortes em nome do Sagrado apontam para um caminho diferente desse. Houve (e ainda há) mortes em nome do Sagrado promovida pelo cristianismo, religião que em seu conceito teológico mais abrangente deveria ser de paz, de acolhimento e congraçamento entre todos os homens e mulheres.

Para contrapor essa bipolaridade ocidental versus médio-oriental, as religiões desse contexto deveriam seguir a mesma linha de apresentar o Sagrado, sob uma perspectiva de alguém que existe para doar vida. De fato, cristãos e muçulmanos conviveram durante muito tempo sem essa guerra religiosa.

Ao se fazer comparações entre alguns textos do cristianismo e textos do islamismo, tidos até como incentivadores da morte dos inimigos de outras religiões, é possível perceber algumas similitudes. Comparemos, pois a Sura 4.74 com o Apocalipse 2.10:

Que combatam pela causa de Deus aqueles dispostos a sacrificar a vida terrena pela futura, porque a quem combater pela causa de Deus, quer sucumba, quer vença, concederemos magnífica recompensa (sura 4.74).[13]

Nada temas das coisas que hás de padecer. Eis que o diabo lançará alguns de vós na prisão, para que sejais tentados; e tereis uma tribulação de dez dias. Sê fiel até à morte, e dar-te-ei a coroa da vida. (Apocalíse 2.10)[14]

Não fossem anotadas as fontes dos dois textos e os mesmos poderiam ser lidos como complementares. O primeiro trata da luta pela causa de Deus, a ponto de sacrificar a vida, com a possibilidade registrada na narrativa sagrada de que, assim sendo, a recompensa futura está garantida. O segundo fala da tentação do diabo, inimigo do cristianismo, que colocará os fiéis por um pouco de tempo em sofrimento e convida ao fiel para uma fidelidade a ponto de morrer e ter como recompensa uma coroa.

Como podemos perceber, e como foi possível fazer nessa interpretação desassociada das regras de hermenêutica e exegese, é possível dar uma conotação pacifica, colocando em pé de igualdade, textos tidos como excludentes, sendo o texto do Alcorão difundido como base para as guerras santas.

Isto faz-nos entender que a interpretação que se faz do Sagrado é antes de tudo, pessoal e que esta interpretação, e não o Sagrado em si mesmo, é que promove aquilo que conhecemos como ações beligerantes tanto de um lado quanto o outro.

Em outro texto podemos comparar:

Combatei-os! Deus os castigará, por intermédio das vossas mãos, aviltá-los-á e vos fará prevalecer sobre eles, e curará os corações de alguns fiéis, E removerá a ira dos seus corações. Deus absolverá quem Lhe aprouver, porque é Sapiente, Prudentíssimo.  (sura 9.14,15).[15]

Serão envergonhados e humilhados todos os que se inflamam contra ti. Serão reduzidos a nada e perecerão aqueles que querelavam contigo. Tu os procurarás, e não os encontrarás, os que te combatiam; serão reduzidos a nada, serão aniquilados aqueles que te faziam guerra. (Isaias 41 11,12)[16]

No primeiro texto, há uma afirmação para o combate, seguido de uma certeza de que Deus castigará os combatidos, fazendo com que os combatentes prevaleçam e ainda uma promessa de que alguns combatidos teriam seus corações curados e absolvidos. No segundo texto, há uma relação parecida entre combatentes e combatidos, entretanto não há clemência para os combatidos, que serão reduzidos a nada.

Neste segundo bloco de textos sagrados, parece-nos que o texto que dá sustentação à ações terroristas é o texto sagrado judaico-cristão, ao passo que o texto sagrado dos mulçumanos denota certa clemência por parte do Sagrado, até mesmo com os inimigos de seu povo.

Há ainda uma série de textos que poderiam ser citados exaustivamente, onde se poderia dar a cada um deles a interpretação que julgássemos necessário, transformando o Sagrado percebido pelos seguidores do islamismo como a melhor opção e fazendo com que a percepção do Sagrado feita pelos seguidores do cristianismo não fosse a melhor opção.

Evidentemente, não nos cabe aqui nestas linhas, fazer um trabalho acurado de interpretação de narrativas sagradas, dispondo de todos os elementos científicos de tradução, exegese, hermenêutica, analisando os textos pelo método histórico-critico, mas a intenção foi mostrar que é possível sim uma interpretação das narrativas sagradas a partir da mente humana e não a partir da realidade do Sagrado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste artigo, procuramos evidenciar que as percepções do Sagrado por parte do humano são de caráter pessoal e não justificam, sequer explicam que uma história de atrocidades perpetradas em nome do Sagrado, tenha ele o nome que tiver, possa ser admitida como fruto dessa relação.

Procuramos demonstrar no artigo, que os conceitos estabelecidos em religiões tidas como antagônicas, como cristianismo e islamismo, são na realidade parte da vivência de seus seguidores e, portanto, não deveriam servir de sustentáculo para as afirmações acerca das divindades seguidas pelos fiéis destas duas grandes religiões monoteístas.

Verificamos também, que a divisão bi polarizada de mundo religioso se transforma em mais um mecanismo de fomentação de ódio, repressão de discurso e estabelecimento de terror, seja através de sacrifícios de vidas humanas ou do cerceamento da liberdade de escolha, inerente ao ser humano.

Consideramos, finalmente, que o Sagrado é o que é, e sendo dessa forma, não é no mínimo inteligente considerá-lo como causa principal de ações maléficas de seres humanos contra seres humanos.

O homem sempre criará gaiolas de prata, chamadas de religião, na tentativa de aprisionar o belo pássaro livre, chamado Deus.[17] E nesta prisão-religião, O Sagrado será tudo, menos o Sagrado.

REFERÊNCIAS

Livros

ALVES, Rubem. Dogmatismo e Tolerância. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

ABUMANSUR, Edin Sued. As moradas de Deus. São Paulo: Fonte Editorial.

GESCHÉ, Adolph. Deus para pensar Deus. São Paulo: Paulinas.

LANGSTON, A.B. Esboço de Teologia Sistemática. Rio de Janeiro: Editora Juerp

OTTO, Rudolf. O Sagrado. Rio de Janeiro: Edições 70

Sites

ALVES, Rubem. O que é Religião. Disponível em <http://files.direito-pucminas.webnode.com.pt/200000356-a6e11a7db0/Rubens%20Alves%20-%20O%20Que%20%C3%A9%20Religi%C3%A3o.pdf> Acesso em 25/11/2015

ALVES. José Augusto Lindgren. Coexistência cultural e “guerras de religião”. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092010000100003&lang=pt > accesso em 28/11/2015

Bíblia

Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.

[1] OTTO, Rudolf. O Sagrado. p. 9.

[2] LANGSTON, A.B. Esboço de Teologia Sistemática. P. 19

[3] OTTO, Rudolf. O Sagrado. P. 40

[4] Idem.

[5] ABUMANSUR, Edin Sued. As moradas de Deus. p. 147.

[6]Idem.

[7] ABUMANSUR, Edin Sued. Op. Citp. 151

[8] Ibidem, p. 152.

[9] GESCHÉ, Adolph. Deus para pensar Deus. p. 15.

[10] ALVES, Rubem. O que é Religião. P. 22. Disponível em <http://files.direito-pucminas.webnode.com.pt/200000356-a6e11a7db0/Rubens%20Alves%20-%20O%20Que%20%C3%A9%20Religi%C3%A3o.pdf> Acesso em 25/11/2015

[11] No texto do Alcorão, encontramos na quadragésima segunda Surata a descrição: “Prescreveu-vos a mesma religião que havia instituído para Noé(1443) , a qual te revelamos, a qual havíamos recomendado a Abraão, a Moisés e a Jesus, (dizendo-lhes): Observai a religião e não discrepeis acerca disso(1444) ; em verdade, os idólatras se ressentiram daquilo a que os convocaste, Deus elege quem Lhe apraz e encaminha para Si o contrito.” Disponível em <http://www.culturabrasil.org/zip/alcorao.pdf> . Acesso em 26/11/2015. Parece-nos claro que, até mesmo para o maior profeta, o Jesus dos cristãos não era uma pessoa causadora de divisões.

[12] ALVES. José Augusto Lindgren. Coexistência cultural e “guerras de religião”. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092010000100003&lang=pt > accesso em 28/11/2015

[13] Alcorão traduzido para o português. Disponível em <http://www.centroislamico.com.br/viewpage_kuran.php?page_id=23> Acesso em 28/11/2015

[14] Bíblia de Jerusalém.

[15] Alcorão traduzido para o português. Disponível em <http://www.centroislamico.com.br/viewpage_kuran.php?page_id=23> Acesso em 28/11/2015

[16] Bíblia de Jerusalém.

[17] Num dado momento da história de Rubem Alves, ele escreveu para sua filha uma estória sobre um Pássaro Encantado e uma menina. Pássaro e menina se amavam. Mas sempre chegava o momento quando o Pássaro dizia: “Preciso ir”. A menina chorava e dizia: “Não vá. Nós nos amamos tanto!” O Pássaro respondia: “Eu preciso ir para ter saudades. Porque o meu encanto nasce da saudade!” E partia. A Menina, então, teve uma ideia perversa: engaiolar o Pássaro para que ele nunca mais partisse. E assim ela fez. Quando o Pássaro voltou, cheio de estórias para contar, cheio de penas de novas cores, enquanto ele dormiu, ela o engaiolou numa linda gaiola de prata. Ao acordar o Pássaro deu um grito de dor. “Menina, vou perder meu encanto. Vamos perder o amor!” E assim aconteceu. Foram-se as cores. Foram-se as estórias que ele contava. Foi-se o amor.

Estudando para o concílio

Deus não pode ser definido. Qualquer definição de Deus partiria de seres humanos. Seres humanos são de mente finita e não conseguem definir um ser infinito. É possível se ter um conceito de Deus, mas não uma definição de Deus.

O conceito que podemos ter de Deus é que ele é amor. O amor explica Deus e diz quem ele é. Cada atributo de Deus é importante e não se pode colocar um atributo acima de outro. Deus é também espírito e como tal não pode ser visto. Além de espírito ele é espírito pessoal e vivo, isso significa que ele não é um mero objeto passivo da investigação humana. É possível estudar o que Deus criou, mas não é possível estudar Deus. Nesse sentido, Teologia não pode ser classificada como uma ciência que estuda Deus, da mesma forma que é a BIO-logia, GEO-logia, etc. Pode-se estudar terra e a vida criada por Deus, mas não se pode estudar Deus. Do que trata então a Teologia? Trata do estudo do relacionamento de Deus com o universo criado.

Além de ser amor, espírito pessoal, Deus é perfeitamente bom. Sua bondade é perfeita. Falar da bondade de Deus está relacionado com falar do caráter de Deus. Dizer que Deus é perfeitamente bom, implica em relacionar todas as excelências de seu caráter. Deus é quem cria, dirige e sustenta todo o universo criado.

É de Deus o interesse de se revelar ao homem. É ele quem pergunta ao homem “onde estás” quando quer saber o motivo pelo qual o homem estava se ocultando de Deus. Hebreus 11 nos mostra que ao longo da história, Deus se revelou através dos pais, dos profetas, nos últimos dias pelo filho. Deus se revela também na natureza criada e o salmista declara que “os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra de suas mãos”. Na sua ação de dar-se a conhecer, Deus disponibilizou algumas fontes de conhecimento: a Revelação, a Inspiração e a Iluminação. Dessas três a que ainda existe é a iluminação. Na revelação Deus faz um desvendamento de si mesmo. Na inspiração, Deus capacita o homem, através do Espírito Santo a descrever em linguagem humana esta revelação que Ele faz de si mesmo. Na iluminação, ainda através do Espírito Santo, Deus capacita o ser humano a entender a revelação que Ele faz de si mesmo.

Considerando que atributos são qualidades relacionadas com um ser existente, e considerando que Deus é um ser que existe desde sempre, podemos perceber que como ser ele possui alguns atributos. Os atributos de Deus podem ser divididos em naturais, que não podem ser comunicados ao homem e morais, que podem ser comunicados ao homem.

Os atributos naturais de Deus são:

Onipresença – Significa que Deus não está restrito ao tempo e espaço. Ele pode agir em qualquer tempo e em qualquer lugar. Não significa que ele encha o universo com sua presença, pois se assim fosse, ele estaria limitado ao universo. Deus é  Espírito, logo, não preenche espaço, pois o que preenche espaço é matéria.

Onisciência – Significa que nada escapa ao conhecimento de Deus. Não há desconhecido para Deus.

Onipotência – Significa que em Deus reside todo o poder. Ele é tão poderoso que nem sequer pode ser tentado pelo mal. Quem pratica o mal é por ele vencido. Se é vencido, não tem todo o poder. Se não tem todo o poder não é Deus.

Unidade – Somados, os atributos de Deus nos dão a ideia de sua unidade.

Infinidade – Significa que Deus é infinito. Deus é onipresente, pois não pode haver limites à sua presença; é onisciente pois sua sabedoria se estende sobre todas as coisas; é onipotente, pois pelo seu poder guia e dirige o mundo.  Todas essas coisas nos dão a ideia de Que Deus é infinito.

Imutabilidade – Significa que Deus não muda. Não muda de propósito nem de natureza. É sempre espírito pessoal perfeitamente bom.

Os atributos morais de Deus são: Santidade, Justiça e amor.

Santidade – É a plenitude da excelência moral de Deus, o princípio básico de suas ações e aferidor único e verdadeiro de suas criaturas. É a soma de todas as suas qualidades morais. A santidade de Deus assegura-nos de que o que ele faz nunca desabona o que ele é. Ela determina o alvo de Deus para a humanidade que é tornar a raça humana semelhante a Ele em santidade. Deus exige que o homem seja santo como ele é santo.

Justiça –  Na justiça de Deus podemos perceber sua intima ligação com a sua santidade. Ele faz sempre o que é direito de acordo com seu caráter. Desta forma, a ação da justiça de Deus pode ser tida como um mau para o injusto e um bem para o justo. Aos que resistem à Justiça de Deus, consideram-na como punição, entretanto, a justiça de Deus é muito mais que castigo, pois sua justiça trata de maus e bons, e sendo a mesma justiça, não pode ser vista como punitiva somente. O amor de Deus é um atributo que revela muito da sua relação com a humanidade. Deus ama com amor que tanto deseja se doar para o amado, quanto deseja relacionar com o amado. O amor de Deus está ligado a uma bondade perfeita.

O universo prova a existência de Deus – O universo é efeito. Todo efeito tem uma causa. A causa do universo é o seu criador, que é Deus. Os 92 atomos não teriam autonomia para gerar o universo tal como foi gerado.

 A história universal prova a existência de Deus – A história universal não registra uma só tribo, por menor que fosse que não possua sua percepção de um ser supremo. Não crer na existência de um ser supremo é crer que ao longo de toda a história da raça humana, em todos os lugares do mundo, ela acreditou em uma mentira.

As percepções provam a existência de Deus – Não há percepção humana sem o objeto da percepção. Em outras palavras, não conseguimos ter percepção daquilo que inexiste, do nada. Na percepção há três elementos indispensáveis: quem percebe, o objeto da percepção e o ato de perceber. Se quem percebe existe, percebe, então há de se concluir que exista também o objeto da percepção. O coração humano tem uma percepção de Deus e isso assegura que ele exista.

A fé prova a existência de Deus – A fé não é somente a base de uma crença em um ser supremo. Ela é também a base de todo conhecimento. O que o homem racionaliza em suas descobertas e busca pela verdade, tem seu início de fato em uma fé de que o que ele busca é a verdade. Ele então satisfaz suas necessidades físicas e intelectuais. Da mesma forma, a fé age no mundo espiritual. Ela revela a necessidade de um salvador. Esta mesma fé que revela a necessidade de um salvador é a que aponta para Deus

A experiência Cristã prova a existência de Deus. – A relação entre o pão e a fome é que o pão sacia a fome. Mas só se sabe que o pão sacia a fome, quando se experimenta o pão. A fé de que o pão é capaz de saciar a fome, por si só, não sacia a fome de fato. A última prova da existência de Deus consiste em o homem experimentar Deus a ponto de saciar sua fome espiritual. Mesmo sendo a fé, a base desse conhecimento de Deus, é somente experimentando Deus, de forma pessoal, que se tem a certeza do que foi sinalizado pela fé.

Há objeções aos argumentos a respeito da existência de Deus. A objeção intelectual compreende que havendo um universo da forma como ele existe, não é necessária a existência de Deus, pois tudo existe com regularidade sem o auxilio de quem quer que seja. Uma refutação dessa objeção é que há leis naturais que o regem o mundo. Todavia, uma lei não é nada a não ser um modo de governar. A lei não é o agente dela mesma. A lei é maneira do governo agir. Deus é o governo que governa segundo as suas leis.

Outra objeção aos argumentos sobre a existência de Deus é a objeção moral. Ela se baseia na existência do mal no universo. Sendo assim, Sendo Deus perfeitamente bom, se não acaba com o mal, é porque ele não é onipotente. Ou se é onipotente e não acaba com o mal é um sádico. Entretanto, quando Deus criou “viu Deus que tudo era bom”. Uma das coisas boas criada por Deus foi a liberdade do homem poder escolher entre obedecer e desobedecer. Escolhendo desobedecer, trouxe sobre si as conseqüências dessa desobediência. Deus colocou uma árvore que poderia comprar essa liberdade de escolha. Se não existisse a árvore, com frutos que foram proibidos de comer, como essa liberdade seria provada? A existência de uma prova a obediência é também uma prova da liberdade do homem, uma das coisas boas criadas por Deus.

Deus foi o criador do universo, logo o universo não tem existência por si só. Ele tem início e terá fim. Não é papel da Teologia determinar a data do inicio do universo. Isso cabe à ciência. O texto sagrado não declara QUANDO, mas declara que FOI criado por Deus. Não há nada que tenha sido criado por Deus que não tenha relação com ele, mesmo sendo Deus maior que o universo criado.  Deus governa o universo por um método uniforme, isto é, por uma lei. A lei não é uma entidade independente, mas é um método. O universo não é governado pela lei, mas é governado segundo a Lei. Deus governa o universo, segundo a sua lei. O propósito de Deus ao criar o universo, é o de criar espíritos livres capazes de fazer a bondade, mas não programados para fazer a bondade. Em bondade, semelhante a de Deus, o homem tem comunhão com Ele. Finalmente, o propósito da criação do universo é glorificação de Deus e a salvação do homem.

Como criador, Deus tem o direito de governar o universo. Deus é soberano, por isso tem poder de governar sobre a criação. Se não governasse não seria soberano, pois soberano sem poder não pode ser soberano.

A vontade absoluta de Deus se estende a toda criação, excetuando o homem. Na natureza, cada planta segue a ordem de reprodução dada por Deus. Assim acontece também com os animais. No caso dos seres morais (homens), Deus o dotou de vontade própria. Por conta disso, a vontade de Deus não é aplicada da mesma forma que entre o restante da criação.

Mesmo tendo o homem a capacidade de escolher e tomar suas decisões, a vontade de Deus é sempre que ele escolha o bem. A escolha do mau não é de fato o desejo do coração de Deus. Nesse sentido, Deus governa não só como criador, mas como pai, que procura levar seu filho a tomar as melhores decisões, permitindo entretanto que este filho escolha por si mesmo.

A doutrina da trindade Divina, embora não seja encontrada exatamente assim descrita no texto sagrado, declara que Deus se revelou de três formas distintas: Deus-Pai, Deus-Filho, Deus-Espírito Santo. Há em Deus três personalidades distintas, sem, contudo existirem três deuses. Os três são pessoas distintas uma das outras, mas em unidade de essência.

João 6.27 declara que o Pai é Deus quando afirma que o pai, que é Deus, selou Jesus para ser aquele que garante a vida eterna. João 1.1. Um texto clássico da declaração de que Jesus é Deus. No princípio era o verbo… o verbo era Deus. Em Atos 5.3 o apóstolo pergunta por que Ananias mentira ao Espírito Santo e completa no verso 4 que aquela mentira fora feita à Deus.

O homem é alma vivente. Por alma vivente compreende-se o fato de que o homem possui corpo e espírito.   O homem difere dos outros animais criados por ter consciência própria, pela capacidade de abstração, pelo reconhecimento de uma lei moral, pela percepção de uma natureza religiosa, pelo poder de escolha de um alvo.

Há certa semelhança entre o Homem e Deus. Genesis declara que Deus, ao fazer o homem, disse que ele seria feito a imagem e semelhança Dele. O fato de Deus ter se revelado ao homem, comprova a semelhança intelectual, caso contrário, a revelação de Deus ao homem não teria significado, assim como não tem para os animais irracionais. O homem se assemelha a Deus também pelo fato de ser de natureza espiritual. Além dessa semelhança natural, há uma semelhança moral. Quando Deus criou o homem, dispensou a ele suas qualidades morais. O homem foi criado bom, com todas as suas tendências para a bondade, perdendo essas características a partir do pecado. O homem não é eterno, mas imortal. Ele é imortal, pois sua natureza essencial é espiritual e essa natureza não morre.

Tendo sido o homem criado a imagem e semelhança de Deus, com sua tendência a fazer o bem, definir a origem do pecado é um grande problema. Podemos dizer que o pecado é uma ação externa ao homem, mas como ele tem o poder de escolher, escolheu pecar. Sendo ação externa, o homem tem uma atenuante diante do pecado. Embora tenha escolhido pecar, ele não pecou sem antes ser tentado a pecar. Esta atenuante da tentação foi utilizada por Deus o Justo Juiz para propiciar o conserto dessa falta. Pecado é um estado mau da alma ou da personalidade humana. Segundo a bíblia o pecado gera a morte. O pecado é também tudo aquilo que nos separa de Deus. O egoísmo é a raiz de todo o pecado e também de todos os males.

Cristologia é o estudo da pessoa de Jesus Cristo, sua natureza e sua obra. Deus determinou a salvação da humanidade desde os primeiros dias. A história do mundo, tal como registrada no texto sagrado revela a intenção de Deus em resgatar a humanidade que havia caído. Nesta ação de resgatar a humanidade. Deus usou de diversos meios, inclusive utilizou-se de pessoas de fora do seu povo para cooperar com seu propósito de salvação.

Além de encontrarmos essa ação na história de povos pagãos, encontramos também na história de Israel. Através da Lei, da profecia e do cativeiro Deus ensinou ao seu povo e o preparou para a vinda do messias.

Jesus tem duas naturezas reais, perfeitas e distintas. Quando em João, os homens de Israel falavam da sua filiação a Abraão, Jesus os criticou dizendo que eles queriam matá-lo por dizer a verdade e que assim faziam pois ele era homem e ainda que Abraão não faria isso. A bíblia ainda afirma que há um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem. Jesus possuía elementos da natureza humana, entre eles, fome, sede, cansaço, amor, tristeza. Esteve sujeito as leis naturais de desenvolvimento.

No tocante a sua natureza divina, o próprio Jesus tinha consciência dessa natureza. Ele afirmou certa vez que: “quem vê a mim, vê ao pai”. João 14.9. Tinha poder sobre a natureza criada. Perdoava pecados.

Jesus experimentou dois estados: Humilhação e exaltação. Sua humilhação se deu em três épocas: Quando o verbo se fez carne, quando esteve submisso ao Espírito e às leis humanas e por ocasião de sua morte no Calvário. Sua exaltação se deu em duas épocas: sua ressurreição e sua ascensão.

Enquanto esteve na terra, Jesus exerceu um tríplice ofício: o de profeta, o de sacerdote e o de rei. Esses ofícios foram exercidos da maneira mais perfeita que se possa imaginar. Nesse sentido, não houve profeta que tenha revelado de maneira mais completa a vontade de Deus ao mundo; como sacerdote, ofereceu sacrifício perfeito para expiação de pecados e como rei estabeleceu seu reino e começou a reinar nos corações dos homens.

Na ressurreição de Cristo reside toda a esperança do cristão. Segundo Paulo falando aos Coríntios, se Cristo não tivesse ressuscitado, nossa pregação e fé seriam em vão. As evidências da ressurreição de Jesus são: o tumulo vazio, as aparições, a existência da igreja, a mudança nos discípulos, entre outras. Após a ressurreição Jesus recebe um corpo real, semelhante ao que fora colocado no tumulo, mas que não estava sujeito à morte nem limitado às limitações de todos os humanos.

A salvação trabalha na vida do homem uma mudança que aponta para seu passado, presente e futuro. A salvação em Jesus tem o poder de zerar os pecados cometidos, inserir o homem em novidade de vida, com vistas a uma existência futura, onde conheceremos a Jesus como somo conhecidos. Não somos salvos apenas para escapar da morte, mas para sermos inseridos em nova vida. Para ser salvo, o homem precisa ter convicção do seu pecado e arrependido sentir necessidade de que Jesus o perdoe. Nesse sentido, a salvação que é pela graça, se processa quando o homem aceita esse presente da graça. Quando um pecador abandona o pecado, para seguir a Jesus, dizemos que houve uma conversão. Isto inclui arrependimento de pecados e o abandono deles e fé para seguir a Jesus, aceitando-o como salvador.

A regeneração é a mudança radical operada na alma humana pelo Espírito Santo, tornando a disposição moral do homem semelhante à de Deus.  A justificação é um ato de Deus em que ele declara o pecador regenerado. A santificação é um processo estabelecido na vida do convertido transformando seu caráter de modo a que ele fique mais semelhante possível ao Deus. O próprio Deus convida: “sede santos porque eu sou santo”. É o Espírito santo que opera o processo de santificação.

O Espírito Santo é uma pessoa. Isso pode ser visto pelos atributos que uma pessoa tem, quais sejam pensar, sentir, querer, amar, ter consciência e direção própria. Isso significa que Ele não é uma mera influência. Outras características do Espírito Santo como pessoa: ele fala, ensina, clama. Ele é o consolador prometido por Jesus antes de ter partido.  O Espírito Santo é Deus. Ele possui os mesmos atributos de Deus, eternidade, infinidade, onisciência. Ele é quem convence o homem do pecado, da justiça e do juízo.

Os dons do Espírito Santo são capacidades dadas ao crente para o desempenho de algum serviço. Os dons são distribuídos segundo um critério divino, como Deus quer.

O estado intermediário dos justos é ao lado do Senhor, pois segundo o texto bíblico, nada nos separará do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nem mesmo a morte. O estado intermediário do ímpio é no inferno. Podemos ver isso na parábola que indica que após a morte o rico foi para o inferno.

As escrituras ensinam que a segunda vinda de Jesus será exterior, visível e pessoal. O texto de atos dos apóstolos declaram que assim como Jesus foi visto subindo aos céus, há de vir da mesma forma.

A ressurreição de Jesus é o fundamento da esperança cristã e a garantia da ressurreição daqueles que nele crêem. O texto sagrado afirma que Cristo ressuscitou dos mortos e foi feito as primícias dos que dormem. Sendo ele as primícias, compreendemos que outros ressuscitarão.

Jesus fará o juízo final, pois é aquele que está intimamente identificado com Deus e intimamente identificado com homem. O estado final do justo é o céu, lugar de perfeita comunhão dos salvos com Cristo, lugar de alegria eterna e o estado final dos injustos é o inferno, lugar de total separação de Deus e de sofrimento eterno.

Igreja é uma congregação de pessoas salvas, batizadas, que se juntam para a promoção do Reino de Deus. Encarrega-se de pregar o evangelho, batizando os convertidos em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Jesus Cristo é o fundador e o fundamento da Igreja. O poder judicial da igreja local é a assembléia.

Existem três sistemas de governo mais conhecido: Episcopal imperial, onde o pastor tem poderes imperiais. Sistema oligárquico, onde a igreja escolhe alguns leigos e um pastor como presbíteros para governarem sobre ela. Sistema democrático ou congregacional, onde a igreja assume a responsabilidade de seu governo próprio sob a presidência de um pastor. O modelo democrático congregacional é o que mais se aproxima com um modelo bíblico.

Há dois tipos de igreja, a igreja local e a universal. A igreja local é uma comunidade de fieis definida geograficamente que se reúne em determinado lugar, motivada pelo mesmo ideal, para cumprir as ordens do mestre, gerindo os assuntos do Reino de Deus. A igreja universal não é definida geograficamente, formada por todas as pessoas que experimentaram a transformação promovida por Jesus Cristo.

A igreja tem o propósito de glorificar a Deus, evangelizar cumprindo dessa forma a grande comissão, produzir crentes maduros e santos, cuidar das necessidades de seus membros e praticar o bem no mundo.

Os oficiais de uma igreja batista são Pastores e diáconos. Diácono significa servo. Aos diáconos compete deixar desembaraçado o ministério pastoral, promover a paz na igreja, promover o bem-estar dos crentes, dar testemunho eficaz, reforçar a liderança. As três mesas designadas aos diáconos são: a mesa do Senhor, a mesa dos pobres e das viúvas e a mesa do Pastor.

A relação da igreja com o Estado é de total separação, mesmo que creiamos que somos cidadãos de duas pátrias.

Batismo e ceia são as duas ordenanças de uma igreja batista. O batismo simboliza o sepultamento do neófito em Cristo, no momento da imersão e a ressurreição quando ele volta das águas batismais. Somente devem ser batizados aqueles que tendo aceitado Cristo como, se tornaram nova criatura. Embora seja para salvos, o batismo não tem poder para salvar. A Ceia é uma comemoração simbólica da morte de Cristo até que ele volte. A ceia pode ser classificada, quanto a participação em Restrita, isto é, destinada a membros batizados numa igreja batista; Ultra-restrita, destinada somente a membros de uma igreja batista local; livre, destinada a todos os crentes batizados em qualquer igreja evangélica e ultra-livre, destinada a qualquer pessoa, sendo crente ou não.

Transubstanciação: É a doutrina que ensina que no ato da celebração acontece a transformação do pão e do vinho na substancia corpo e sangue de Jesus.

Consubstanciação: É a doutrina que ensina que a presença real de Cristo se dá quando a ceia é ministrada, pela união de dois ou mais corpos em uma só substancia concedendo aos participantes bênçãos especiais.

Há três formas de disciplina na igreja batista: normativa, corretiva e cirúrgica. A normativa é estabelecida através dos ensinamentos (escola bíblica, seminários, sermões), a corretiva se dá quando há uma falta, em aconselhamentos individuais, visando corrigir um procedimento errado. E a cirúrgica é o desligamento do rol de membros, que deve ser em último caso.

A relação entre o pastor e a igreja deve ser de absoluta lealdade, amor, carinho, respeito, conforme Hebreus 13.17.

Substituição solidária – Uma Cristologia para os dias atuais.

            A partir de uma análise do neoliberalismo é possível perceber que seus conceitos são fortemente rechaçados pela visão do evangelho, onde o Cristo se coloca como servo de Iaweh e como homem da substituição-solidariedade. No neoliberalismo, evoca-se a pessoa do “EU” e cria-se a noção de individualismo, e não somente isso, mas de uma guerra, travada de forma a estabelecer o próprio crescimento. No contexto neoliberal, ninguém é instado a viver uma vida de troca, ou de substituição. A política neoliberal, ensina que você deve lutar para alcançar o seu lugar no espaço, e o individualismo é tido como algo normal.

            Na teologia veterotestamentária, a figura de uma expiação se torna fragilizada tendo em vista que havia expiação sem que, necessariamente, existisse arrependimento. Desta forma, a expiação não se estendia para a vida, mas se limitava a um ritualismo frio e sem muito sentido. Anos mais tarde, o povo de Israel coloca em uma mesma linha a expiação a partir do sofrimento. Este sofrimento não é em causa própria, mas em substituição à outras pessoas, sejam elas conhecidas ou não.

            Quando é feito o anúncio profético da vinda do Messias, já se vislumbra um futuro onde aquele ungido de Deus, serviria de forma completa, tanto ao Pai, que o enviou, quanto aos homens, para quem ele foi enviado. Em Jesus se insere esta espiação substitutiva, que espera, em contrapartida do ser humano, somente o arrependimento.

            O tempo dos bodes que caminhavam pelo deserto, sem destino, carregando o peso de pecadores que não se arrependiam cessara. Inaugura-se o tempo do cordeiro, que leva os pecados da humanidade e espera que, ao aceitar este sacrifício, o ser humano consiga se entender como alguém que precisa buscar o arrependimento de seus delitos.

            A ação de substituição outorga ao homem a capacidade de ter o Cristo se assemelhando a ele, ser humano, e, numa via de mão dupla, considera o ser humano como semelhante ao Cristo. O que antes era rico, agora se torna pobre, e os que antes eram pobres se tornam ricos, por serem considerados filhos de Deus.

            Desta forma, Jesus, ao deixar seu lugar de origem, vindo ao encontro do homem, não se coloca em posição de destaque, antes, se coloca na posição do mesmo ser humano a quem quer substituir. Além disso, a obediência ao pai fecha o ciclo de esvaziamento, onde o filho se esvazia de si mesmo, cumprindo toda a ordem divina de vir a terra, encarnar, sofrer, amar até a morte de cruz. Não é uma ação somente de sofrer por amor a alguém, mas é ação de obediência incondicional e de sofrer no lugar de alguém. O ser humano, com suas contingencias, não conseguiria obedecer ao Eterno, da mesma forma que um ser humano, chamado Jesus, conseguiria. É possível que a tentativa de toda a humanidade, não cumprisse em sua totalidade as exigências de Iaweh, e, portanto, foi preciso que o filho fizesse essa parte pela humanidade.

            Mesmo sendo assim uma substituirão que faz o que não é possível para a humanidade fazer, esta não fica inerte, aguardando as benesses da substituição. Existe no ser humano a responsabilidade pessoal, pois ao nos substituir, o Cristo fez mais do que ocupar nosso lugar e nos anular de uma responsabilidade. Mesmo que haja o lugar do Cristo, o substituto, não deixa de existir o lugar do ser humano, o substituído. Isso significa dizer que, ao nos salvar, o Cristo não nos retira o nosso papel na salvação. Ao contrário do que muitos postulam, não é um aceitar a salvação e não fazer nada, posto que tudo já foi feito. A substituição não é nunca foi aniquilação do ser substituído.

            Já não é possível ver a substituição feita pelo Cristo, como algo que tem um poder meramente jurídico. A todo pecado, o Eterno exige uma satisfação apropriada. O homem pecou, mas não pode dar esta satisfação apropriada. Deus, por mais que ame  ao ser humano, não pode ser injusto, perdoando-o sem que houvesse o cumprimento dessa satisfação. A solução está então, na substituição feita pelo Cristo. A humanidade não tem como pagar satisfatoriamente pelo seu pecado, mas o Deus-homem tem essa possibilidade.

            Essa explicação, embora lógica, não se fundamenta plenamente, tendo em vista que o advento do pecado não causa somente incomodo na relação entre o Divino e o humano, mas causa também incômodos na relação entre o humano e outro humano, entre o humano e o cosmos. Nesse sentido, ao aceitar a substituição do Cristo, o ser humano precisa trazer de volta aos eixos anteriores as relações com o próximo e com a natureza criada.

            O discurso teológico brasileiro, não enxerga, em sua grande maioria, esta forma de substituição de duas mãos. No Brasil há discursos teológicos que validam a desigualdade social. Nesses discursos, proferidos por religiosos descomprometidos com a verdade, teólogos de quinta categoria, de fundo de quintal é possível ouvir vozes que dizem “você caminha mal,quando não dá ao Senhor aquilo que é devido”. Desta forma, criam com seus discursos a ilusão de que cada um deve cuidar do seu próprio progresso, a despeito do fracasso de seu irmão.

            Enquanto as contas bancárias das instituições religiosas, equivocadamente chamadas de Igrejas, crescem exponencialmente, a miséria de seus membros crescem na mesma proporção.  A teologia espúria do “é dando que se recebe”, parece funcionar de fato para um lado só, o lado que dá a falsa esperança de uma vida melhor e recebe o dinheiro como paga para sua teologia-lixo.

            Para conseguir este intento, em muitos casos, retorna-se a um processo de expiação, sem substituição e arrependimento. Sem substituição, pois se fossem dessa forma, exigiria aos alcançados pela substituição um posicionamento de equilíbrio com o Eterno, o próximo, consigo mesmo e com o cosmos. Sem arrependimento, pois não se cultiva a necessidade de reconhecer a possibilidade de não se ter como pagar ao Eterno pelos delitos, precisando para isso do Deus-homem como substituto.

            Desta forma, não é mais o Cristo, o substituto, mas a instituição. Não é raro encontrar discursos que criam delimitações que já não são mais “antes e depois de Cristo”, mas as novas delimitações são “antes depois da igreja X”. Isto nos revela que a fé se tornou privatizada. Não é mais a fé no Cristo substituto, mas é a fé no cristo substituto da igreja X. Nesse sentido, a fé nesse cristo é paradoxal, já que se apresenta como solução de um só lugar, sendo esse substituto individualizado e não oferecido a todos os povos.

            No contexto social brasileiro, é possível encontrar a corrupção, o tráfico de influencias, a desonestidade, o desvio criminoso de verbas, o superfaturamento, sem que sequer se saia do contexto da instituição chamada igreja. Desse modo, como será possível construir uma teologia brasileira que se digne a mostrar o verdadeiro teor da substituição de Jesus Cristo? Como fazer com que o ser humano perceba a igreja como representante do Cristo substituto, quando ela mesma age de forma individualista?

            A resposta a essas perguntas deverá ser um dos desafios de todos os cristãos, quer sejam eles teólogos ou não. Se não existirem respostas a essa indagação, de nada adiantará anunciar um Deus que, diante de dúvidas tão contundentes, prefere permanecer calado.

Sobre as perguntas em tempo de crise e o futuro do Cristianismo

Teologia em tempos de crise

            Se, como afirma Benedito Ferraro, temos mais perguntas que respostas em tempos de crise, pode-se  dizer que estamos vivendo, no contexto do cristianismo atual, o tempo de todas as perguntas, muitas vezes, sem nenhuma resposta a curto prazo.

            A proposta cristã superficial de que aceitar Jesus como caminho verdade e vida, já não garante todas as respostas que o ser humano precisa. Alguns, e arrisco dizer, uma grande e assustadora parcela, acreditam que já detiveram o conhecimento do caminho verdade e vida, entretanto, continuam perdidos em seus próprios caminhos, e o que é pior, no caminho, verdade e vida que acreditam conhecer.

            O significado deste caminho, verdade e vida, não tem conseguido atingir o ser humano, pois aqueles que deveriam dar esse significado, proferem discursos contrários ao significado. Por conta disso, ainda encontramos tanta injustiça social, exclusão, permeando e no meio de um evangelho que por si só tem uma proposta de justiça e inclusão. No contexto do Brasil, essa realidade é cotidiana, explicitada nos meios de comunicação e mesmo assim, a resposta teológica para esse sistema ainda é frágil, quando existe. Na maior parte do tempo, não há sequer proposta teológica para esse tipo de situação.

            No mundo globalizado, criador de centenas de milhares de excluídos, o cristianismo não pose se resumir numa pregação cujo discurso seja do tipo “aceite Jesus para ir para o céu”, quando toda a problemática que atinge esse excluídos acontece aqui na terra. É preciso que os cristãos progridam dessa reposta teológica padrão, tendo em vista que, na perspectiva do Cristo, o Reino de Deus não se estabelece no céu, mas na terra. Viver um evangelho que ignore isso é viver um evangelho em desacordo com o próprio evangelho, onde o próprio Cristo ensina orar, suplicando para que o Reino venha até nós, e não nós sejamos levados ao Reino.

            Se, de fato, quisermos que o discurso teológico cristão, tenha algum efeito transformador, precisamos entender o ser humano, distribuídos em suas várias culturas, carece de apliquemos nossos discursos a partir da diversas culturas existentes e não nos fixarmos na mesmice estabelecida pelos dogmas cristãos, que, ao serem aplicados indiscriminadamente  à vários povos, sem os considerar com povo, se torna um discurso vazio e puramente religioso.

            Mesmo sendo a verdade do cristianismo única, a aplicação dessa verdade dependerá sempre do significado dado a essa verdade. Para considerar o discurso teológico cristão como eficaz, será preciso fazer um esforço de modo a significar a verdade do Evangelho às realidades multiculturais dos países. Será preciso também que o teólogo progrida de um saber único para um saber plural acerca do ser humano. O teólogo que se furtar desse avanço em outros saberes, estará fadado a transmitir uma verdade que só sirva para um contexto pequeno de uma realidade diminuta.

            Que respostas teológicas poderemos trazer para um mundo que direciona seu potencial produtor não para aumentar esses produtos, de modo a satisfazer a necessidade do ser humano, mas simplesmente para, aumentando a produção, auferirem maiores lucros? Que respostas a teologia pode dar, ao falar do Eterno para as pessoas que não tem o mínimo de condições para ter uma vida digna? Já não é mais resposta plausível, aquela que se dá no contexto de uma salvação futura, tendo em vista que os problemas não são do futuro, mas da realidade presente. Nesse sentido, dizer que Jesus supre todas as necessidades humanas e deixar o ser humano carente, é um contrassenso. Anunciar o Cristo, como o pão da vida, e permitir que o ser humano padeça de fome, é fazer um discurso teológico sem fundamento.

            Se há, na teologia cristã, certa predisposição ao combate da idolatria, é preciso perceber que em muitos casos, o modelo de idolatria definido há séculos atrás, não é o mesmo de hoje. Há hoje uma idolatria sem postes-ídolos, estes foram substituídos por deuses conceituais, sendo o mercado capitalista um os maiores. Não há sentido em apresentar um Deus, sem que ele represente, ao mesmo tempo, vida eterna, pão, terra para plantio, local onde morar com dignidade e liberdade.

            Está claro, na narrativa bíblica que o Eterno faz opção pelos pobres e excluídos. No contexto  da América latina, o mesmo Deus que agiu através dos profetas, nos últimos através do filho, já não pode ser visto nos índios, negros, mulheres, crianças, migrantes, favelados, camponeses sem terra. Desta forma, é possível perceber que se faz necessário a busca por um discurso teológico que enfrente a realidade de o cristianismo estar na contramão do que que ensinou o próprio Cristo, quando disse “o Reino de Deus está em vocês”.

            Um discurso teológico que não enxergue as minorias, é um discurso desconectado das características do Cristo, que sempre se colocou no lugar dos vitimados, a ponto inclusive de substituí-los na cruz. Se há opressão político-social, o papel da teologia é ir na via contraria dessa opressão, propondo soluções para a desvalorização do pobre e do excluído da vida social onde ele habita. A opção teológica equilibrada, fará surgir uma opção político-social equilibrada, o que pode ser visto como utopia, mas que em ultima instancia, é chamado de Reino de Deus.

            O discurso teológico cristão deve estar atento na forma de divulgar as verdades do evangelho, de modo que, ao faze-lo não trate a cultura de outros povos como algo menor, o que tornaria a propagação desses verdades um autoritarismo, no lugar da expressão da liberdade. Nesse sentido, o discurso teológico deverá respeitar o horizonte cultural, sem contudo, correr o risco de, para proteger a cultura, cair no erro de um reducionismo.

            Por fim, o discurso teológico cristão, não deve apresentar um cristo que não seja humano, mesmo que ele seja Deus. É na humanidade do Cristo que o homem se identificará e conseguirá dessa forma, encontrar-se consigo mesmo

A espera da aurora

 

            Qual é o futuro do Cristianismo? Esta pergunta está presente no texto e Jean Delumeau.  Muito mais que isso, é uma pergunta que está presente na história do cristianismo moderno. De fato, é um pensamento que se tornou corriquei nos últimos anos de que o cristianismo está fadado a se extinguir.

            Existe um decréscimo generalizado no que se refere às práticas consideradas comuns o cristianismo, existindo uma diferença entre a religião que se vive e a religião proposta pelas instituições religiosas. Na Europa, que foi por muito tempo um dos lugares centrais do cristianismo, os conceitos sobre a bíblia, casamento, família, religião e domingo como dia religioso, já não tem a mesma representatividade. Para Delumeau, está ocorrendo, principalmente na Europa, mas não somente nela, um processo de descristianização que progride velozmente.

            O cristianismo paga uma hoje um extensa conta, pelos erros cometido pela instituição no passado, quando seus dogmas, ao serem contestados eram cobrados com torturas e morte. Mesmo que o cristianismo tenha sido a religião que mais tenha feito sua mea culpa, é tão desconfortante quanto inegável perceber que ainda há quem cobre pelos pecados cometidos em nome de Deus, mesmo que, esta mesma instituição tenha sido a base para difusão de conhecimento e da cultura.

            Nesse sentido, há certa hipocrisia em quem insiste e culpabilizar o cristianismo, no lugar de entender a culpa dos seres humanos e não da instituição. Há um cuidado em até mesmo preservar os grandes prédios e monumentos cristãos, sem contudo existir uma preocupação em preservar o que serviu de base e inspiração para tais construções. Preserva-se o que se vê aos olhos, mas não se preserva a fonte de inspiração para o que se vê aos olhos.

            O mesmo cristianismo, considerado como agonizante por muitos, é o cristianismo que faz aflorar as ações altruístas que, em grande parte do mundo, tem servido para o resgate da dignidade de muitos. Outro resultado do cristianismo foi o de ter transformado radicalmente a sociedade por onde ele se difundiu, estabelecendo obras de caridade, estruturas hospitalares, entre outras ações de cunho humanitário.

            Se há um processo de descristianização da Europa, o mesmo não acontece em outras regiões como na América Latina, Africa e Asia. O decréscimo europeu, então, não significa um declínio do cristianismo em todos os lugares do mundo.

            Considerando que a humanidade está sempre em movimento, o cristianismo precisa adotar uma postura de movimento sempre apontando para o futuro, e se não o fizer, estará fadado a se tornar uma religião incompreendida. Será preciso que o cristianismo inove para adaptar-se a uma realidade sempre em movimento. É preciso se desprender de uma organização imutável e mostrar a encarnação de forma radical, sem desconsiderar o pensamento do homem moderno.

            O século XX foi responsável pela morte de vários cristãos, desde simples fiéis até aqueles que ocupavam posição de destaque na religião cristã, e muitos deles assumiam a postura do Cristo quando disse “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Parece-me que o cristianismo não se conformará a afirmação de que ele morrerá, e ainda mais, crescerá a medida em que seus seguidores forem perseguidos. Mas é preciso que se perceba que a modernidade e a globalização não conviverá bem com o cristianismo tal como o conhecemos. Para se manter e continuar sendo relevante na sua mensagem, o cristianismo precisará buscar um meio para transmitir sua mensagem neste mundo atual.

Resumo do texto “Esse Deus que dizem amar o sofrimento” de François Varone

            Se há vários textos do antigo testamento que fundamentam um total desagravo da parte de Deus pelo sacrifício sangrento, por que motivos o cristianismo se apegou tanto a esse tipo de visão da salvação? O Sangue e o cristianismo só podem fazer uma dupla perfeita se não estiverem sob o signo da religião. É a fé que faz com que sangue e cristianismo se consolidem.

            Quando o ser humano se viu diante do principio religioso de que o homem fraco deve se humilhar diante da divindade, tendo que pagar pelo seu perdão, acabou por entender de forma errada o sangue e o sacrifício de Jesus, rebaixando-os a somente a uma morte expiatória, tal como os animais da antiga aliança. Esse mal entendido, colocou o cristianismo em posição de rejeição e descrença.

            É preciso que se faça um exercício de libertar o sangue e o sacrifício de Jesus do contexto da “satisfação”, devolvendo-o para o contexto da revelação. No encontro do Cristo com Zaqueu, fica claro que a salvação se dá a partir da vida de Jesus e não a partir da sua morte. Nenhum sangue foi derramado na casa de Zaqueu, para que Jesus dissesse: “O Filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido”. A fala de Jesus, em vida, sequer considera que Zaqueu era um homem que pudesse encolerizar Deus e suscitar nele a ira, que exigiria o sacrifício.

            A forma como o cristianismo percebeu a “satisfação”, acabou fazendo de Deus um ser mau que está interessado somente cumprir rituais e preceitos jurídicos. A “satisfação” reduz Jesus a uma função meramente expiatória, tal como os animais da antiga aliança. Seguindo por esse caminho, toda a sua vida, ação e ensinamento só serviram para excitar o seu carrasco.

            Além de deformar a face de Deus, a “satisfação” deforma o sentido da igreja fazendo dela somente um poder religioso que está entre o homem pecador e o Deus ameaçador. Desta forma, a igreja passa a ser um mecanismo ritualista e ritualizante da fé cristã, afundando o cristianismo na religiosidade.

            O ser humano, sendo fraco, busca organizar meios para atingir o todo poderoso. Para isso, faz sacrifícios cada vez maiores a ponto de atingir o maior dos sacrifícios: o sacrifício humano. O novo testamento se preocupa, em sua maior parte, em mostrar o movimento da igreja sob a inspiração do Espírito Santo, entretanto, se não há um olhar para a fé, existindo somente um olhar religioso, a leitura principal e o acontecimento clímax do novo testamento acaba sendo a morte bruta de Jesus e todo o seu suplício. Essa é uma perversão feita pela religião ao sacrifício de Jesus.

            A religião entende que o homem não tem mais como suprir a falta cometida, tendo em vista que o único bem supremo que ele poderia oferecer, já está comprometido pela punição dada pelo pecado cometido. Não existindo na humanidade um só inocente cuja morte teria valor, a morte do filho de Deus, inocente, satisfaz o preço exigido pela culpa da humanidade. A morte de Jesus satisfaz não só o preço pelo pecado, como aplaca o medo do religioso diante da terrível justiça de Deus.

            A religião contribuiu também para fazer com que o ateísmo existencialista perceba a salvação como uma não-salvação. Se o pecado do ser humano suscitou a ira divina, e somente a morte do inocente filho de Deus pode aplacar essa ira, que motivos tem esse Deus para continuar mantendo o ser humano em um caminho para a morte? A conclusão que se chega, a partir do pensamento religioso, é que o homem não recebe a salvação. No lugar de ter uma salvação, o homem se torna um bloqueado, preso ao medo desse Deus exigente. O medo decorre da percepção religiosa de que Deus ainda não ficou totalmente satisfeito com a morte do seu filho, desta forma, o homem tem uma salvação que não o salva, antes parece que a salvação é para salvar Deus. A religião faz da transcendência de Deus um ar viciado, entregando-o a uma asfixia.

            A “satisfação” isola a morte de Jesus, fazendo dela um fato jurídico, uma exigência de Deus, diminuindo seu valor como ação reveladora. A morte do filho, como processo de revelação do Pai, faz da salvação algo concreto na vida do homem, fazendo com que o que agrade infinitamente a Deus não seja a compensação dos pecados, mas a libertação do desejo do homem.

Na revelação, Jesus Cristo passa a ser visto pelo ser humano como alguém que vai além do sacrifício e o leva a experimentar de um Deus benevolente.  Desta forma, torna-se possível enxergar a real face de Deus, totalmente contrária à face difundida pela religião, a face do amor de Deus.

Perceber este Deus benevolente nos faz agir de forma diferente, mudando nossa forma de apresentar Deus para os outros, de modo que, se enxergamos um Deus benevolente, o apresentaremos tal como ele é, anunciando-o de forma diferente ao que preceitua a teoria da “satisfação”. Passamos a anunciar um Deus com características contrárias a teoria da satisfação, que revela um Deus que ama o sofrimento e o sacrifício de seu filho.

Ao proclamarmos Deus como Deus de amor, libertamos o homem da alienação e da opressão de um deus falso, de quem devemos ter medo. O homem recebe a mensagem de forma correta e é liberto do julgo “satisfação”, não existindo mais a necessidade de se aplacar a ira deste Deus que exige um preço sangrento pelo pecado.

A relação do sacerdócio religioso com a abordagem Humanista da Psicologia no Conceito de Carl Rogers.

A formação teológica, seja no âmbito de um centro universitário, onde não se confessa nenhum tipo de fé, ou em algum seminário confessional, é na maioria dos casos, o caminho utilizado por muitos que se sentem vocacionados ao sacerdócio religioso.

No que se refere ao instrumental teórico oferecido pelos cursos de Teologia, encontramos a Psicologia como uma disciplina fundamental para a formação futuro teólogo ou sacerdote religioso.

Dentre as abordagens descritas no material didático da disciplina de Psicologia Social, é possível destacar a abordagem Humanista da Psicologia.

Por discordar da ideia de que todo ser humano se desenvolve ancorado em um padrão predeterminado, imposto por uma herança biológica, tal como os animais, a teoria Humanista contribui grandemente para a formação Teológica.

O futuro sacerdote religioso, ao estudar a abordagem Humanista da Psicologia e perceber o ser humano e seu comportamento, não deve compreendê-lo a partir de uma percepção patológica.

Além disso, a abordagem Humanista se enquadra na formação do futuro sacerdote religioso, tendo em vista que não trata o ser humano a partir de abordagens metodológicas instrumentais, que visam verificar o comportamento, sem, contudo, atingir o ser humano naquilo que é mais claro: a sua humanidade.

O sacerdote religioso precisa compreender que os seres humanos têm reações diferentes dos animais. A experiência humana ajuda a construir o seu Self.

A abordagem do Carl Rogers é de extrema importância para o estudante de Teologia, tanto para aquele que almeja o sacerdócio religioso, quanto para aquele que busca somente a formação Teológica.

Nesta abordagem, o sacerdote religioso encontra argumentos que favorecem ao tratamento dos problemas daqueles que serão objetos do seu sacerdócio, a partir das orientações apontadas pelos membros de suas instituições religiosas e não a partir daquilo que ele, como sacerdote, pensa.

O sacerdote religioso deverá, em suas ações sacerdotais, compreender a formação do Self de cada pessoa a quem ele exercerá seu sacerdócio. Ao compreender que o autoconceito está em contínuo processo de formação, a partir das situações vivenciadas pelo ser, o futuro sacerdote religioso terá mecanismos para compreender o comportamento dos membros de sua comunidade de fé. Não deverá o pretendente ao sacerdócio religioso ter uma visão distorcida daqueles a quem ele vai exercer esse sacerdócio, tendo que compreender que cada ser tem uma percepção global de si mesmo, baseada nas suas experiências passadas, vivencias presentes e expectativas futuras. Tal percepção será de grande importância, a fim de não se criar uma generalização do ser humano, respeitando suas individualidades e sua humanidade.

Outro ponto importante a ser observado pelo sacerdote religioso é o que Rogers define como Self ideal. Os indivíduos a quem o sacerdote religioso dispensará seus cuidados, podem apresentar características que gostariam de ter e de dizer que possui e são suas, mesmo que esta não seja a realidade. Compreender essa realidade proporcionará ao sacerdote religioso uma percepção de que o individuo não é anormal por desejar características que não tem, todavia, ele terá que saber identificar quando o processo de se apoderar dessas características se torna algo patológico.

Com a teoria de Rogers de que o cliente é o melhor especialista de si mesmo, o sacerdote religioso deverá ouvir o membro de sua comunidade de fé, estabelecendo um relacionamento de compreensão e aceitação de forma positiva e incondicional.

História do cristianismo e teologia

cristianismo
05/03/2013

    A teologia cristã tem dois caminhos em suas origens: os evangelhos sinóticos e a literatura Paulina.

    A princípio, a igreja se reunia em sinagogas e nas casas. A expressão εκκλησία (Eklesia), em princípio, tem somente o sentido “daqueles que se reúnem”, no caso do cristianismo trata-se dos que se reuniam para ouvir os ensinamentos dos apóstolos.

    Os cristãos de Jerusalém nunca desistiram de suas identidades judaicas e, por conta disso, se reuniam nas sinagogas. O cristianismo é somente uma seita judaica, no seu princípio. Quando Jesus reinterpreta a lei, ele dá sentido aquilo que ele acha fundamental.

    O cristianismo surge no processo histórico, não sendo possível determinar uma data de seu início. A respeito da teologia cristã, é possível dizer que o novo testamento é o primeiro discurso teológico acerca do cristianismo. É correto dizer que o novo testamento é uma teologia fontal, isto a partir do novo testamento é que se formula a teologia cristã.

    A teologia cristã segue por dois caminhos: os evangelhos sinóticos e a literatura paulina, sendo a teologia paulina anterior à teologia dos evangelhos sinóticos. Os evangelhos se encarregam de levar a teologia cristã para o mundo judaico, e a literatura paulina leva a teologia cristã para a Asia e a Europa.

    Os primeiros momentos do cristianismo são momentos de muito ineditismo no que se referé à experiência de fé. Foi preciso, então, sistematizar esta fé. Nas cartas aos gálatas e aos romanos, Paulo faz descrições acerca da graça, e estas descrições parecem ser intencionais, de modo que sobre o assunto “graça” todos tenham um pensamento único. Entretanto, quando Paulo fala sobre “carisma” (dons), ele não da uniformidade à questão.

    A teologia dos evangelhos sinóticos é diferente da teologia paulina. Enquanto a teologia de Paulo é temática, a teologia dos evangelhos sinóticos é fundamentada em narrativas. Se na teologia de Paulo encontramos o cristo pré encarnado, na teologia dos sinóticos encontramos o cristo que se fez homem, habitando no meio de homens. É no evangelho que se dá o lugar do Deus encarnado. O que Deus faz em Cristo (unir todos os homens) é feito a partir de um lugar. Se não há essa localização, não há como entender o mistério de Deus em Cristo.

    A teologia cristã, na sua origem é diversificada. Na teologia paulina há quatro temas importantes: Teologia, Cristologia, Antropologia e Eclesiologia. A Eclesiologia paulina é impressionante e inovador. A igreja é algo que está sendo pensado há muito pouco tempo. Os dois referenciais para Paulo pensar acerca da igreja são o templo e a sinagoga. Para Paulo, a igreja é ministerial. Trata-se da reunião de ministérios (serviços). A Eklésia paulina é pneumatológica, isto é, o Espírito é quem faz acontecer. Nesse sentido, estar em Cristo é estar em um perspectiva igualitária, não existindo maior ou menor.

    A ideia de carisma, para Paulo, é a participação do seguidor de Cristo a ora de Cristo. Os dons são diferentes na sua manifestação, mas do ponto de vista da dignidade, eles são iguais. Os dois atuam de forma diferente para a edificação da igreja. Desta forma, na Eclesiologia paulina, não há uma percepção de valores. Todos os dons são igualmente importante pois tratam de edificar a igreja.

    Paulo é um judeu e todas as vezes que ele fala de Deus, faz referências ao que é comum a todos os judeus: o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó. Nesse sentido, não há muita novidade, a não ser a associação do cristo aos elementos comuns ao judaísmo.

    O tema da pré-existência do Cristo está presente na teologia paulina, tendo sido este tema tratado posteriormente em João. Paulo pensa a fé cristã para além de uma experiência pessoal com Jesus. É Paulo, o responsável pela estruturação filosófica do cristianismo, não mais a partir da experiência pessoal.

    Na antropologia paulina, o verbo de Deus encarna no ser humano e o efeito dessa encarnação impacta diretamente a vida do Homem.

    Considerando o texto paulino “onde abundou o pecado, superabundo a graça”, Paulo explica que por Adão entra o pecado no mundo e por Jesus o pecado saiu do mundo, ou a graça entra no mundo. O pecado entrar no significa que todos os homens são solidários em pecado em Adão. Se considerarmos como o cristianismo é difundido, basta nascer para ser pecador, mas para ter acesso a graça é preciso ter nascido em um lugar onde o cristianismo tenha sido difundido, ter aceito o cristianismo, para somente então ter acesso a graça. Nesse sentido, a graça se torna inferior ao pecado.

    A antropologia bíblica é bem fundamentada nos ensinos paulinos. É preciso entender bem a antropologia paulina para compreender a cristologia.

 12/03/2013

     Há que se considerar ainda, literaturas mais tardias tais como os escritos joaninos (evangelhos, epístolas e apocalipse), as cartas ou epístolas católicas (Pedro, Hebreus, Judas e Tiago) e as epístolas pastorais (I e II Timóteo). Este tipo de literatura tem seu lugar do ano 70 d.C. Em diante. A diferença da teologia cristã no novo testamento está acentuada entre as cartas paulinas e as cartas pastorais.

    O capítulo 3 de I Timóteo demonstra uma opção por uma hierarquia eclesiástica, além de fazer referência aos dons descritos por Paulo nas cartas às igrejas. A teologia de ministério, nas cartas pastorais, foca em uma Hierarquia. O capítulo 2 de Tito fala de uma organização da vida social. Com relação às mulheres, estabelece que não há lugar na hierarquia eclesial para mulheres. Romanos 16 mostra a mulher com posição de apostolado.

    Na virada do primeiro para o segundo século, começa uma profunda mudança na teologia cristã, indo cada vez mais de encontro ao mundo greco-romano. Nesse momento, a igreja começa o seu processo de institucionalização. Em um primeiro momento, o cristianismo é um movimento sem estrutura jurídica, sem estrutura patrimonial, sem estrutura doutrinária, e para que esse movimento pudesse ir adiante, era necessário que ele se institucionalizasse. Do primeiro para o segundo século o cristianismo toma corpo como instituição. O passo inicial e determinar uma ordem hierárquica. Há uma tensão muito grande entre o carisma e o poder. A estrutura tende a abafar o carisma, que está ligado aos ministérios e na teologia paulina, os ministérios são dados à todos sem distinção. O exercício do dom é o que configura um carisma.

    Nas cartas pastorais é feito uma transição, saindo da discussão sobre cristianismo primitivo, avançando até o final do primeiro século entrando pelo segundo século. E o momento dos padres apostólicos. O cristianismo, nesse tempo, é difundido no meio de outras religiões bem fundamentada, desta forma, havia o desafio de dar sentido à fé no cotidiano, tendo como desafio de estabelecer uma fé muito bem fundamentada. O batismo, que é um elemento comum á diversas religiões, só difere no cristianismo pela forma: “em nome do Pai, Filho e Espírito Santo”.

    A eucaristia era um momento singular e de grande valor nas primeiras comunidades. Era o momento de partilhar a ceia, como lembrança da morte de Jesus e acontecia sempre que existisse uma reunião de cristãos.

 19/03/2013

 A racionalidade da fé (Séculos III e IV)

  • África oriental e norte da áfrica

    – Cipriano: crise dos “lapsi”

    – Tertuliano: a afirmação da teologia trinitária

  • Egito

    – Alexandria

    – Clemente – Logos espermáticos

    – Orígenes e a crise com Ário

  • Síria

    – Influência semítica

    – Afraates

     Nos séculos II e III, diversas correntes teológicas estão convivendo e o cristianismo não está identificado com nenhuma instituição. Há muita proximidade entre a formação de uma hieraquia com diferença de ideias. Se não há hierarquia definida, há alguma diversidade de ideias. Para que as ideias fossem únicas, a hierarquização teve que se tornar mais rígida.

     Os concílios ecumênicos: Teologia e política (Seculos IV e V)

  • Constantino e o concílio de Niceia: o imperador traz a igreja para dentro do império

  • Teodósio I e o concílio de Constantinopla: a igreja se torna um meio para unificar o império.

  • Concílio de Calcedônia: a igreja se torna igreja imperial.

     O gnosticismo, seita surgida no cristianismo não considerava Jesus como homem. Não aceitavam a possibilidade dele ser humano e divino. O texto bíblico joanino combate o gnosticismo. Marcião, influenciado pelos gnósticos, discute as escrituras, criando um canon que julga ser verdadeiramente cristão. Considera que as cartas paulinas é que são importantes. Para ele, os evangelhos são importantes somente do ponto de vista histórico. As questões colocadas por Marcião, leva a igreja a definir um canon comum para todas as comunidades cristãs.

    Havia alguns grupos qu aceitavam a humanidade de Jesus, mas não aceitavam a divindade de Jesus. Com conceitos monoteístas radicais, não conseguiram admitir Jesus como Deus. Um dos representantes mais importantes era Ário, que não aceitava a ideia de que o Pai, o Filho e posteriormente o Espírito Santo eram uma mesma essência, sendo porém pessoas diferentes. Para Ário, Jesus é o primogênito de Deus. Na perspectiva trinitária, Jesus era não criado Segundo Ário, Deus cria o primogênito, antes da criação do mundo. Tendo Deus criado o primogênito (logos), da a ele a função de criar todas as coisas. A história segue seu curso, e mais tarde, o logo se fez carne. Nesse sentido, Deus cria o Cristo, que mais tar e fará homem.

    A discussão de Ário tem desdobramentos sérios, sobretudo no que se refere à soteriologia, pois sendo Jesus somente homem, não consegue fazer a mediação entre Deus e os homens. Neste caso, Jesus é o que se pode chamar de protótipo de homem.

    Os concílios foram os lugares onde os grandes debates teológicos aconteceram. Para se combater o conceito ariano, o concilio de Niceia declarou que Jesus é o filho unigênito de Deus, da mesma essência de Deus (homeousus)

    Politicamente, havia uma divisão em quatro do império romano. Constantino, após um sonho passa a dialogar com o cristianismo, proibindo a perseguição. Constantino tinha como grande amigo Eusébio de Cesareia, que acabou interpretando a história como sendo aquele momento, um momento singular para o cristianismo. Esta aproximação começa em 312 e se fortalece em 317. em 325 o próprio imperador convoca o concílio de Niceia. Este concílio, além de uma importância teológica, tinha também uma importância política. A convocação do concílio, feita por Constantino, tem como um dos propósitos unificar o cristianismo. A decisão final o concílio tendeu a repudiar o conceito arianista, mas isto não põe fim no problema existente entre o povo cristão. Constantino, no fim de sua vida, pede para ser batizado por um dos bispos de pensamento ariano, o que gerou uma grande controvérsia.

    O concílio de Constantinopla reafirmou o Homeousus, discute que o Espirito Santo é também uma pessoa de mesma substância de Deus.

    Do ponto de vista político, no concílio de Constantinopla, acontece o surgimento do que conhecemos como catolicismo romano. O imperador Teodósio decreta o cristianismo como religião oficial do império e as outras religiões passam a ser intoleradas. Neste tempo, para ser cidadão romano era necessário ser cristão.

 09/06/2013

     Do século VIII ao século XIV, temos um período conhecido como idade média. A Patrística abrange um período que vai do século II ao século VIII. A Escolástica abrange o período que vai do século X ao século XIV

    O cristianismo ganha força ao ser o orquestrador da organização de um novo império: o sacro império romano do ocidente. O ocidente cristão, político e religioso é conhecido como cristandade.

    A Escolástica se desenvolveu no período da idade média. A idade média, ainda que tenha sido um período de muita tensão, foi também um período de profundas reflexões teológicas. Foi um período de tirania e corrupção por parte da igreja, tendo as cruzadas e a santa inquisição como principais produtos.

    Do ponto de vista político, os anos de 312 a 394 contaram com dois imperadores importantes, Constantino e Teodósio I. Houve uma aproximação com o império romano. Com a ordem de suspender a perseguição, cessa a mortandade dos cristãos. A aproximação da igreja com o império e tido como uma resposta divina. Em 394, o cristianismo é reconhecido como uma única religião do império romano.

    Todo momento de perseguição é um momento de união e vigilância. Quando cessa a perseguição, há um relaxamento, tando da vigilância quanto das percepções teológicas e doutrinárias. A hierarquia na igreja diminuiu a relação em comunidade. Havia uma errônea visão de que o dom era exclusividade do clero, cabendo aos leigos somente a obediência. Nas cartas pastorais, os dons estão sobre o clero e não sobre os leigos.

    A forte hierarquização da igreja produz uma reação de protesto, de denuncia contra a corrupção. A forma de protestar era sair dos grandes centros e ir para os desertos. A esse movimento deu-se o nome de Anacoretas (monges). Na origem do movimento monacal, a ideia não era de fuga, mas de contestação. A vida no deserto remetia a ideia de local onde satã está. O que os cristãos desse movimento faziam era ir de encontro a esse satã, para lutar contra, através da contemplação, oração, meditação e leitura das escrituras. Este movimento foi importante por manter as características do cristianismo na idade média.

    Os anacoretas se dividiam em grupo, dos quais os mais importantes foram os Eremitas e os Cenobitas. A questão fundamental dessas peregrinações no deserto deu-se no retorno aos grandes centros, quando serviam como grandes sábios que sustentava a igreja do ponto de vista da reflexão teológica. Estes movimentos acontecem no mesmo momento em que a teologia cristã está em um momento altamente erudito, no que se refere a reflexão filosófica. O legado do movimento anacoreta tem sua maior influência na idade média. O clero secular foi o que se envolveu mais em corrupção. Boa parte dos padres seculares da idade média exerciam sua função a partir do poder econômico que possuem antes de serem padres. Os mosteiros foram os responsáveis pela preservação de toda a literatura de um determinado lugar.

    O conceito de heresia é problemático. É um conjunto teológico, mas que por vezes foi fundamentado por questões política. A diversidade teológica no cristianismo passa a gerar problemas quando a diversidade gera contradição. O gnosticismo é a primeira manifestação de diversidade que provocou contradições nos termos da negação da humanidade de Jesus. A forma de judeus e gentios enxergarem cristo na essência é a mesma. Os judeus entendem Cristo a partir do judaísmo e de suas leis, enquanto que para os gentios não há necessidade de considerar o judaísmo.

 16/04/13

     O aprendizado moderno está intimamente ligado a figura de se aprender em um colégio. Nos templos de Platão, o aprendizado estava relacionado ao exercício de pensar. A base para a teologia cristã era o pensamento filosófico grego e um pouco de retórica romana.

    Agostinho faz teologia a partir da filosofia. Possuía uma carreira filosófica distinta, passando por várias escolas filosóficas, dentre elas, a mais importantes são o maniqueísmo e o ceticismo.

    Para o maniqueísmo, o mundo possui duas fontes principais. A preocupação filosófica era explicar o principio de tudo. Para o maniqueísmo, as origens possuíam um duplo olhar. Ha uma fonte que gera o mal e outra que gera o bem.

    Epicuro propôs um dilema: Deus pode criar uma pedra tão pesada que nem ele pode erguer? O cristianismo moderno está acostumado a enxergar Deus a partir das categorias onipotência, onipresença, onisciência. O que está por trás do dilema de Epicuro é a teodiceia. Como o ser humano lida com o mal? Olhando por mera observação, percebe-se que existe o mal no mundo. Para algumas tradições, isso não é um problema. Para a cultura grega, no mito de Édipo, não há incomodo algum ao perceber que a divindade produza o mal. O mal é um problema para o cristianismo, pois para os cristãos tudo que foi criado por Deus é bom. Para o judaísmo, não há problemas em perceber Deus como alguém que geral o mal. A pergunta que o cristianismo faz é: de onde surgiu o mal, tendo em vista que Deus não criou o mal?

    Para o maniqueísmo, há uma força que cria o mal e outra que cria o bem. Agostinho, no começo de sua carreira, pensava como Maniqueu. Para Agostinho, o mal está no ser humano, não sendo exterior. O mal é um estado. A fórmula que agostinho cria é: “não posso não pecar”, isto é, a condição de pecado é inescapável.

    Agostinho então se pergunta: de onde vem este mal que leva a pecar? Poderá o Deus, confessado plenamente bom, criar qualquer coisa contrária à sua natureza? Ele questiona: o mal pode ser criação do inimigo? A resposta para esta pergunta é NÃO, pois só há um ser capaz de criar e este é Deus. Ao agostinho, ao escrever “O livre Arbítrio”, responde que o mal não é um ser. O mal é a ausência do ser. Neste caso, o mal está relacionado com o Homem e a sua liberdade. Para ele, o homem foi criado com plena capacidade de escolha e vai se encontrar em um momento de escolha. Ao ler o Gênesis, de forma literal, ele entende que o Homem tem capacidade de escolher. Ele deve escolher entre a sua liberdade (ser) e a sua não-liberdade (não-ser). A escolha do Homem é quem determina o surgimento do mal que não tem determinações metafísicas.

    Agostinho considerava o primeiro casal como o casal original e a sorte da humanidade estava nas mãos deste casal. Quando o Homem faz a opção pelo não-ser, perde a capacidade de escolher (não posso não pecar). A partir deste ponto, agostinho define a escolha pelo não-ser como pecado original. Em Adão somos solidários da raça humana. Se o primeiro Homem pecou, todos pecaram. Para Agostinho ser completamente coerente com a ideia de que o pecado que nos condena é o que foi praticado por Adão, ele definiu que até as criancinhas vão para o inferno. Para Agostinho, o mal é histórico. Se há alguém que produz uma tentação que nos faz escolher o não-ser, isso não muda o fato de que a escolha pelo não-ser é nossa.

    Agostinho faz uma leitura de Paulo por intermédio de Platão, que tinha como característica pensar no dualismo. Tudo que é bom e perfeito e verdadeiro, está na alma, ou no mundo perfeito das ideias e o oposto disso está no campo das coisas. Para se chegar a perfeição, seria preciso que o ser humano se desprenda do mundo das coisas (matéria). Agostinho interpreta o cristianismo a partir do neo-platonismo (Plotino). Ele faz uma contraposição do Homem carnal com o Homem espiritual. Para ele, é preciso viver uma vida espiritual para vencer a carne. Ele entende que Paulo quis dizer que para evitar o pecado, que reside no corpo, é preciso viver no espírito. Para agostinho, o pecado foi transmitido através do sexo.

    Paulo pensa diferente. Para ele o que faz o Homem ser carnal ou espiritual é a sua relação com a Lei e a Graça. Se ele entende que o que o justifica e constrói sua vida é estabelecido a partir de méritos, ele é carnal. Se o ser humano, mesmo não sendo praticante da religião, entede que sua justificação é pela graça, ele é espiritual.

 21/05/2013

     O filme “O nome da rosa” retrata as duas correntes teológicas da idade média. O monasticismo, com sua teologia monástica e o Escolasticismo, com sua teologia especulativa.

    A existência dos mosteiros contribuiu para a consolidação do cristianismo. Não fosse a existência dos mosteiros é possível que não tivéssemos o cristianismo tal como existe hoje.

    Com a queda do império romano, dividido em até quatro partes, quando os povos dominados perceberam a divisão, começaram a atacar. O cristianismo institucionalizado corre então grandes riscos. Exatamente neste momento surgem os mosteiros que se destacam. Entre a queda do império romano e o surgimento do sacro império germânico, há uma lacuna e os mosteiros ganham força, tendo o cristianismo, nos mosteiros, um importante centro cultural, político e econômico. As ordens tem esse papel de “segurar” este triplo papel.

    A civilização ocidental, fora dos grandes centros, experimentava uma profunda decadência em função das invasões bárbaras. Os mosteiros serviram para conservar o aspecto cultural. Neles se conservava a cultura letrada e fora deles todos eram analfabetos. Nos mosteiros, os monges dedicavam toda a sua vida para copiar o texto bíblico, fazendo dessa forma a preservação cultural.

    Do ponto de vista econômico, o mosteiro era responsável pela concentração de riquezas. Como dominava a vida cultural, produziam riquezas. Às margens dos mosteiros se estabeleceram os burgos, formado por pobres que recebiam permissão do mosteiro para plantar, sendo todo o produto do plantio revertido para o mosteiro, ficando com os pobres somente o suficiente para se alimentar.

    A medida em que se percebeu o lucro, começou-se a estabelecer em terras distantes as dioceses. Os bispos, responsáveis pelas dioceses compravam o seu título da igreja e passa a repetir na dioceses o modelo econômico dos mosteiros, repassando parte do ganho para a igreja. Quanto maior o poder econômico, maior a difusão desse modelo econômico. O clero, então, detinha todo o poder econômico e politico. Neste momento, o celibato passou a ser importante para manter o poderio econômico da igreja nas mãos do clero. O celibato não era necessariamente castidade.

    O mosteiro, pelas razões políticas, econômicas e culturais se tornaram o centro do mundo. Nos mosteiros se desenvolveu uma teologia mistica, onde se pensava que sobre Deus não se devia falar muito, mas experimentar no aspecto mistico. Por mistica, entenda-se uma tradição cristão de profundidade teológica. Nesse sentido, era possível conciliar espiritualidade com teologia.

    Teologia negativa – O teólogo se convence que diante do mistério o que se deve fazer é calar. É um profundo conhecimento de que a teologia não tem condições de descrever Deus. Para entrar em contato com Deus era utilizado uma forma que não exigia mediação de contato. Mesmo nos que nos mosteiros tenha se desenvolvido uma teologia muito profunda, esta não foi a mais importante, sendo a Teologia Escolástica a mais importante.

    A teologia escolástica surgiu nas escolas. Nas catedrais foram se desenvolvendo escolas que estudavam as seguintes ciências: Trivium, onde se estudava a retórica, a gramática e a dialética e o Quatrivium, onde se estudava a aritmética, a geometria, a música e a astronomia. O que se pretendiam alcançar nessas escolas era a reflexão especulativa. Nesse momento, a teologia se transforma na principal fonte do saber tendo a filosofia como parceira. A Escolástica diz que é possível fazer analogias entre a criação e o criador. Das escolas de teologia, surge em Paris a primeira universidade, no seculo XI.

 Sobre o texto: Provas ontológicas e provas cosmológicas.

     Não se consegue pensar nada maior que Deus. Este que pensarmos não pode existir somente aqui, logo, se ele existe além daqui, ele é real. Se não está no nível da nossa existência e inteligencia, significa que é superior.

    O simples fato de provar a existência de Deus coloca a teologia escolástica no nível da linguagem da argumentação. Essa característica da teologia escolástica ganha limites absurdamente grandes. Neste momento, a teologia está próxima da metafísica. Se discute muito, nesse momento, as relações entre as pessoas da trindade.

    Para Tomas de Aquino, tudo que é vivo tem movimento e tudo que está em movimento é movimentado por um outro motor. Se retrocedermos nesse argumento, chegaremos a um motor imóvel (Aristóteles). Tomas de Aquino chama esse motor de Deus.

    Para cada causa incausada, Tomas de Aquino, referenciando-se a Aristóteles, diz que “todo efeito tem uma causa”. Retrocedendo nesse conceito, chegaremos a uma causa originária chamada por Tomás de Aquino de Deus.

    Para o argumento de “sumamente perfeito”, Tomas de Aquino refere-se a Platão (mundo real x mundo das ideias). Para Tomas de Aquino o que sumamente perfeito é Deus.

    A nossa reflexão vai do contingente ao necessário. Tomas de Aquino faz referencia a essência e a existência. O necessário é Deus, todas as outras coisas são contingencias.