Jonas: Simbologia e Verdade

I – INTRODUÇÃO
Na Bíblia encontramos muitas narrativas, que servem para nos ajudar a entender e explicar a existência humana muito mais em função daquilo que o homem realiza do que em função das realizações de alguma divindade. Temos registrado na bíblia a narrativa de Jonas, profeta enviado a Nínive para pregar sua eminente destruição. Depois de andar na contramão do que lhe fora mandado, acaba não somente pregando a conversão para os ninivitas, mas tomando parte de um sentimento misto de desapontamento e derrota. Quando percebe que há uma mudança radical em todos os moradores da cidade, onde, por ordem do rei até mesmo os irracionais devem prestar adoração a Deus, ele entra em uma crise que o remete para desejo ardente de destruição daquele povo. De forma contundente, questiona os motivos pelos quais Deus resolve poupar a cidade.
Este trabalho tem como finalidade demonstrar a relação entre o que é simbólico e o que é real nos textos bíblicos. Mesmo que existam lacunas, o propósito é mostrar que, diante de uma leitura com uma visão desassociada da fé, os textos não devem ser entendidos de forma literal, sem, contudo perder seu valor de fé.
II. A SIMBOLOGIA.
Jonas rebela-se contra a ordem dada por Deus de pregar aos ninivitas e decide empreender uma viagem de navio para Társis. Em meio à viagem, sobreveio uma tempestade que assusta a todos, exceto Jonas. Todos clamam por seus deuses enquanto Jonas dorme. Decide-se então lançar sorte sobre todos os ocupantes do navio e a sorte cai sobre o próprio Jonas que confirma o real motivo daquela tempestade.
Lançado ao mar, Jonas é engolido por um grande peixe, permanecendo em suas entranhas por três dias e três noites. Jonas resolve clamar a Deus que ouve sua oração e ordena ao peixe que o vomite na areia da praia.
Deus renova a ordem dada anteriormente a Jonas e o envia definitivamente para Nínive.
Chegando à cidade, Jonas prega contra ela e prediz que em quarenta dias a cidade seria subvertida. O arrependimento é instantâneo fazendo com que a plebe, a monarquia e até mesmo os animais fizessem jejuns e clamassem a Deus por perdão. A ordem é seguida por todos e Deus se arrepende de ter pensado em destruir Nínive.
Neste momento, qualquer pessoa pensaria que Jonas ficaria feliz por ter conseguido fazer a cidade entender sua mensagem. Entretanto, ele questiona com Deus e chega a pedir que se lhe tirasse a vida. Jonas sai da cidade, faz uma cabana e senta-se para ver o que aconteceria a cidade. Deus intervém mais uma vez e faz crescer uma aboboreira que alivia o enfado sentido por Jonas e isto o deixa muito alegre. Nova intervenção de Deus e um verme destrói a aboboreira.
Por causa disto, Jonas deseja novamente a morte. Deus questiona com ele dizendo que não existindo trabalho por parte de Jonas, existia, contudo a revolta pela morte da aboboreira e se era assim o seu comportamento, por que ele questionava a compaixão divina por Nínive, que demonstrava ser um povo que mal sabia distinguir a mão direita da esquerda.
III. A VERDADEEm seu conteúdo, a saga de Jonas passa por um processo que nos remete ao desejo de suplantar obstáculos internos e renascer novamente.

Muito mais do que crer numa história altamente fantástica, com tempestades, grandes peixes, arvores que nascem crescem e morrem num período curtíssimo, o leitor precisa entender o que ela representa quando é lida hoje.

Sem querer passar pelo campo da pesquisa arqueológica, onde poderíamos apontar algumas tensões no texto, relacionado com a cidade, geografia, hidrografia, basta a visão de um homem engolido por um peixe e vomitado na praia para que se perceba que essa não é a principal mensagem do texto.

O que é simbólico serve para encaminhar o leitor para o real valor do texto aplicado na vida de quem o lê. Não é possível postular a crença na fé religiosa, neste caso a fé em um Deus que realiza feitos fantásticos a não ser através do símbolo.

Há um processo de suplantação de obstáculos e renascimento. Este processo é a realidade de todos os homens, que, desejosos de progresso encaram os obstáculos do dia a dia e na possibilidade de não serem competentes o suficiente para suplantá-los, clamam a uma divindade que vem em seu socorro. É a realidade atual do irreal vivido por Jonas.

Grandes peixes querem a todo tempo engolir pequenos homens. Pequenos homens sempre clamam por auxílio. Auxílio sempre vem de forma fantástica.

É na carência de Jonas, que clama em grande angústia, que se revela a própria angústia dos homens.

Os homens não precisam pregar a destruição de Nínive hoje, mas tal como Jonas, precisam eles próprios se converter de seus caminhos egoístas. O primeiro homem a quem Deus queria trazer o arrependimento era o próprio Jonas. Era ele quem deveria ser encaminhado para uma vida de mudança radical.

Na total inexistência de provas de sua realidade, o homem é confrontado com a seguinte verdade: Jonas precisa de transformação radical, mas Jonas não existe. A transformação radical, essa sim existe e precisa acontecer, então, pensa o homem, eu sou o “Jonas real” no lugar daquele que não é real.

O conto nos mostra como a princípio Jonas, assim como todos os homens é um mero escravo. Ele se escraviza, primeiramente, diante de seu próprio prazer, quando evita a árdua tarefa de pregar em Nínive.

Em uma segunda vez, quando deseja ardentemente a destruição daquela nação. A realidade do homem é, em certo sentido, uma realidade de escravidão. Vive-se uma vida de preconceitos e de padrões preestabelecidos que excluem todos os que fogem desses padrões. Assim como o padrão de Jonas para Nínive era destruição em quarenta dias, o padrão do homem é a destruição total da liberdade do outro para a satisfação da própria vontade de quem deseja a destruição.

IV – CONCLUSÃO

Existem duas visões sobre a interpretação do livro do profeta Jonas que merecem, a título de conclusão, ser aqui comentados.

Há aqueles que acreditam na narrativa de Jonas como sendo a mais pura expressão da verdade, usando como justificativa a ideia de que se está na bíblia é verdade. Esta argumentação é oriunda de uma fé fundamentalista que não suporta passar por uma crítica histórico literária.

Um outro extremo é determinado por pessoas que simplesmente colocam o texto de Jonas como um conto imaginário que não merece nenhuma credibilidade.

Esta argumentação é pobre, pois não percebe o real sentido do texto. Criticar um texto tal como o de Jonas e dizer que o mesmo não pode ser entendido como literal, não significa destruir a fé de quem quer que seja. Fé que não resiste a uma crítica é fé que nunca existiu.

Numa leitura crítica, sem, contudo transformar a fé em algo descartável, encontramos em Jonas a verdade de que não são os valores dos homens os mais importantes para a divindade e muitas vezes, a divindade escolhe aqueles a quem o homem reputa por inadequados para receber dela suas benesses.

Outra verdade refere-se ao fato de que mesmo que se tente fugir da divindade, em algum momento o homem necessitará clamar por ela, e, mesmo que o estado do homem seja de desagravo para com a divindade ela o socorrerá. Ler Jonas excluindo essas verdades é fazer uma leitura pobre e a maneira como Deus fez chegar até nós todas as verdades foi através da simbologia contida no Livro.

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